A Adama Brasil, empresa que fabrica esse agrotóxico que faz parte da composição do Agente Laranja, de triste memória no Vietnã, é a única que não aderiu a um acordo com o MPRS para oferecer um uso em condições um pouco menos prejudiciais que as habituais.
Na segunda-feira, 5, o MPRS pediu à Justiça estadual que aplique uma multa de R $ 21,77 milhões de reais (cerca de 5,27 milhões de dólares) à empresa, que seriam destinados ao Fundo para Reconstituição de Bens Lesados, administrado pelo próprio Ministério Público.
Mesmo quando a empresa fabricante tem autorização para o uso do 2,4 D, ela deve ser punida porque, “usado na forma como é usado”, esse agrotóxico pode causar graves danos à saúde, ao meio ambiente e à sociedade, afirmou o operador gaúcho de justiça ambiental Alexandre Saltz.
O 2,4 D, um dos primeiros agrotóxicos sintéticos - começou a ser produzido na década de 1940 - sendo comumente utilizado em plantações de soja, trigo e milho.
Pesquisas científicas comprovaram que o 2.4 D não só mata as ervas daninhas presentes nessas plantações, mas também um grande número de espécies vegetais lá presentes.
No Rio Grande do Sul, onde o MPRS encomendou auditorias em 23 municípios, foram constatados sérios impactos nas plantações de uva, maçãs, frutos cítricos, erva-mate, na produção de mel, em árvores e em outras espécies de plantas nativas.
O Ministério Público apresentou estudos que também destacam o elevado potencial nocivo do 2,4 D para a saúde humana.
Em vários países do norte da Europa e em algumas áreas do Canadá e da África do Sul, o 2.4 D foi proibido. A UE vem estudando há anos demandas que vão no mesmo sentido.
Em 2019, o Serviço Nacional de Saúde e Qualidade Agroalimentar (SENASA) da Argentina proibiu a fabricação, importação e comercialização de certas formulações deste agrotóxico devido à sua “alta volatilidade” e aos danos que podem causar.
No mesmo ano, sob o governo golpista de Michel Temer, os sojicultores brasileiros conseguiram preservar seu uso, mas diante das denúncias feitas por pequenos produtores e por organizações sociais do Rio Grande do Sul, foi formado um "grupo de trabalho" visando a conseguir compatibilizar o 2,4 D com o respeito ao meio ambiente e à saúde da população.
O organismo concluiu que se trata de um produto altamente perigoso, muitas vezes "mal utilizado", e adotou uma série de normas e recomendações para sua comercialização, todas burladas pela Adama.
Organizações ambientais e cientistas independentes exigem sua proibição pura e simplesmente.
Mas o contexto do Brasil inteiro não é nada favorável a esse tipo de iniciativas, portanto não seria diferente no Rio Grande do Sul.
No final de junho, a Assembleia Legislativa estadual aprovou um projeto de lei do governo que flexibiliza a importação e o uso de agrotóxicos proibidos na origem, alterando radicalmente uma regulamentação em vigor desde 1982, que colocava o Rio Grande do Sul na vanguarda neste quesito.
“Vamos transformar o Rio Grande do Sul na lixeira dos produtos proibidos na Europa e nos Estados Unidos, lugares onde são fabricados”, disse a deputada Luciana Genro (PSOL), durante a discussão parlamentar.
Mas o deputado Frederico Antunes (PP), da bancada governista no RS, deixou bem claro quais são os objetivos do governo federal e também do governo estadual gaúcho.
“Os agroquímicos são como medicamentos e estão aprovados pelos organismos de controle”, disse Antunes.
Nesse contexto, medidas como a multa pelo uso indevido do 2.4 D, mesmo que sejam melhores do que nada, correm o risco de serem apenas um paliativo, como uma gaze, sobre uma enorme ferida que supura.