-A agressão ao marco legal também se traduz em maiores riscos para a segurança e saúde no trabalho?
PL– Também, inclusive produzindo uma destruição dos mecanismos de controle e de participação dos trabalhadores, dando aos empresários melhores condições para atuarem de maneira unilateral.
Diminuíram também as possibilidades de se chegar a convênios favoráveis aos interesses dos trabalhadores e das trabalhadoras, e hoje prevalecem os convênios por empresa sobre os convênios por setores da atividade. Esses fatores foram minando a negociação coletiva.
Soma-se a isso o fato de a reforma trabalhista ter facilitado a desestruturação do mercado de trabalho, promovendo a individualização das relaciones trabalhistas e as terceirizações.
VL- Hoje, um em cada dois trabalhadores espanhóis vive em situação precária.
O medo de perderem o emprego e estarem convencidos de que se perderem o trabalho, o próximo será ainda pior, instala a precariedade na cabeça dos trabalhadores e das trabalhadoras.
PL- Aproximadamente 35 por cento dos contratos trabalhistas feitos na Espanha têm uma vigência menor a um mês.
Isso faz com que os trabalhadores nem sequer consigam aprender direito a sua função, aumentando mais ainda os riscos sanitários.
Quem sai ganhando com isso é o empresário, que melhora sua margem de lucros.
-Então, a tendência é que os acidentes de trabalho aumentem…
VL- Obviamente. Já há um crescimento claríssimo no número de acidentes de trabalho.
Em um país onde são tão numerosos os contratos por um dia, por dois dias, o mesmo por algumas horas, capacitar o funcionário passa a ser uma atividade praticamente inexistente.
O aumento nos danos à saúde da classe trabalhadora devido ao deterioro das condições trabalhistas, à precariedade e ao desgaste das políticas públicas ativas em matéria de prevenção são um problema primordial de saúde pública na Espanha.
-E as pessoas sofrem em silêncio, como sentencia Christophe Dejours*…
PL-Exatamente. Estamos em um período de pouca mobilização social, poucos protestos, mas de qualquer forma há reações.
Em 8 de março, houve uma manifestação em grande massa, e não acreditamos que tenha sido apenas pelas questões de gênero. A greve das mulheres nesse dia também revelou um mal-estar social muito mais generalizado.
A distribuição desigual do capital e dos esforços está provocando reações de indignação.
Por um lado, temos o governo e os empresários afirmando que já saímos da crise e que a economia está novamente crescendo. Mas, por outro lado, vemos os salários caírem, as condições trabalhistas piorarem, e um predomínio dos contratos-lixos.
Isto produz uma indignação que até o momento, é verdade, não mobilizou substancialmente as grandes massas.
VL-Uma das cosas mais dramáticas deste período é ver como a ruptura do sujeito coletivo conseguiu minar a solidariedade entre os companheiros.
Atualmente, cada um se vira como pode.
PL- As pessoas terminam aceitando essas más condições de trabalho, sem direito ao descanso, e ainda passam a vida trabalhando em condições ruins.
Terminam reclamando em silêncio, e esse silêncio adoece.
*Christophe Dejours é um médico francês, especialista em medicina do trabalho, psiquiatria e psicossomática.
Foto: Ramón Baeza