Ministério Público do Trabalho
Descoberto trabalho escravo no cruzeiro MSC Magnifica
O inferno flutuante
Ilustração: Allan McDonald (Rel-UITA)
Os leitores do jornal virtual A Rel já estão acostumados a ler matérias nossas cujo protagonista é o Ministério Público do Trabalho (MPT) do Brasil , onde merecidamente é destacada a forma de atuação de seus procuradores.
Nesta oportunidade, iremos nos ocupar do caso de 11 trabalhadores de um cruzeiro turístico resgatados pelo MPT em condições de trabalho análogas à escravidão.
O cruzeiro, onde os trabalhadores resgatados trabalhavam, era o MSC Magnífica, da empresa ítalo-suíça MSC Crociere. Essa empresa, fundada como Flotta Lauro Lines em 1987, foi adquirida pela Mediterranean Shipping Company em 1989, passando a se chamar StarLauro Crociere.
Em 1995, a empresa mudou novamente de nome, devido à perda de popularidade pelos incêndios que afundaram dois de seus navios, nascendo entao a MSC Crociere.
Atualmente, é a quarta maior operadora de cruzeiros do mundo e a segunda maior da Europa.
Nem tudo é claro na empresa do ramo de cruzeiros MSC Crociere. Em que pese a empresa se autoproclamar como de espírito italiano, todos os seus navios estão registrados no Panamá e possuem bandeira de conveniência, enquanto que a sua sede fiscal situa-se em Genebra, na Suíça.
O navio MSC Magnífica tem capacidade para 2.518 pessoas, contando com 1.038 tripulantes.
Condições degradantes
Assédio sexual, moral e humilhações constantes
A fiscalização foi feita no dia 1º de abril passado, quando a embarcação estava no Porto de Salvador (Bahia), mas a investigação começou no Porto de Santos (São Paulo).
Os tripulantes sofriam constantemente assédio sexual e moral, trabalhos penosos, humilhações e punições, além de cumprirem jornadas de até 16 horas.
Os contratos de trabalho eram assinados com base em um acordo internacional, o que é irregular no entendimento dos procuradores do MPT da Bahia.
De acordo com os procuradores, os brasileiros contratados e prestando serviço no país estão submetidos à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), nome dado ao código trabalhista no Brasil.
A força-tarefa contou também com a participação do Ministério do Trabalho, da Defensoria Pública da União (DPU), da Secretaria Nacional de Direitos Humanos e da Polícia Federal.
Após o resgate, começaram as negociações com a transnacional e suas subsidiárias, sem que fosse registrado qualquer progresso. A MSC se nega a reconhecer a condição degradante do trabalho e a cobrir os gastos de hospedagem e de transferência dos trabalhadores às suas cidades de origem.
Anderson Matsuura, integrante do grupo de trabalhadores resgatados, declarou: “cheguei a trabalhar até às três e meia da madrugada apesar de retomar o turno às sete da manhã. Isto sem um dia de folga durante meses”.
Já Eduardo Sobral conta que para trabalhar no navio, teve que pagar um curso.
“A empresa de recrutamento cobrou quase 5.000 reais (2.200 dólares) de cada um de nós para que fôssemos chamados. Tivemos que fazer empréstimos e depois lá dentro, mesmo sofrendo com o excesso de trabalho e as humilhações, tínhamos que suportar calados para pagar o que ficamos devendo ao banco e à família”.
Sobral deixou a embarcação junto com a esposa Vânia. O casal trabalhava no setor de bufê.
Caos jurídico
A necessidade de ratificar o Convênio 2006 da OIT
Segundo o procurador do trabalho Rafael Garcia, a empresa impõe aos tripulantes um caos jurídico, infringindo tratados internacionais, a Constituição Brasileira e a já mencionada CLT.
“Os tripulantes trabalhavam até 16 horas em horários fracionados e sofriam todo tipo de pressão e maus-tratos a bordo.Isso quando ainda estavam em águas territoriais brasileiras. Imagina agora que o navio partiu para a Europa”.
Os sindicatos do setor estão exigindo do governo brasileiro a ratificação do Convênio 2006 sobre trabalho marítimo da OIT, que entrou em vigor no ano passado.
Segundo estas organizações, são cerca de 10 mil trabalhadores brasileiros embarcando e trabalhando em navios de cruzeiro e em outros que navegam ao longo da costa e dos portos do Brasil.