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O cruzeiro do horror
Em Montevidéu,
Brasil
CRUCEROS
Com Jair Krischke
 
O cruzeiro do horror
Quando trabalhar é um calvário
Muito além de todo esse glamour com o qual os cruzeiros turísticos estão associados em todo o mundo, nos conveses inferiores desses enormes paquidermes de aço, geralmente se vive um drama humano pouco conhecido: o dos jovens trabalhadores e trabalhadoras submetidos a um regime quase escravagista. A Rel dialogou sobre isto com Jair Krischke, presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos (MJDH) de Porto Alegre.
-O que está acontecendo nos cruzeiros turísticos?
-No Brasil já tem surgido uma grande quantidade de problemas com as empresas que contratam pessoal para trabalhar nos cruzeiros. Elas atraem gente jovem -especialmente moças, rapazes também- que é treinada em cursos rápidos para trabalharem como babysitters, camareiros, recreadores, garçons, pessoal de cozinha, de limpeza, etc.
 
O contrato que estes jovens assinam diz que receberão salários de aproximadamente 1.600 dólares mensais.
 
A realidade é que isto termina sendo um trabalho escravo porque devem fazer jornadas de 14 a 16 horas diárias, sofrendo em muitos casos assédio moral, sexual e maus-tratos em geral. Inclusive há uma investigação sobre o caso de uma empregada brasileira que teria se suicidado, se jogando ao mar próximo à costa da Itália.
 
Outro caso foi o de uma moça que foi desembarcada no porto de Santos, Brasil, e internada em um hospital. A irmã da vítima contou que a moça apresentava sangramento por todos os seus orifícios, vindo finalmente a falecer.
 
Também há testemunhos sobre uma jovem que foi assassinada a bordo do cruzeiro, mas sem que fosse feita a necessária investigação, posteriormente.
 
-Isto acontece porque muitos têm “bandeira de conveniência”?
-Claro.  E isto funciona assim: são navios de empresas brasileiras, inglesas, holandesas... Mas a sua bandeira é da Libéria, do Panamá ou de outros países que, a troco de dinheiro, vendem licenças de navegação, algo como uma espécie de cheque em branco.
 
 Por outro lado, muitas destas empresas contratam mão de obra terceirizada nas Filipinas ou em outros países e, também, do sul asiático.
 
Eu colaboro em nível profissional com a Federação Nacional dos Trabalhadores no Transporte Marítimo e Afins, e sei que eles estabeleceram um salário mínimo de 800 dólares mensais, mas os filipinos são enganados e aceitam trabalhar pela comida e pela promessa de um pagamento de 300 dólares mensais que, muitas vezes, nem chegam a receber.
 
Quando se trata de marinheiros profissionais, existem organizações históricas de trabalhadores marítimos que são uma referência de primeiro nível para qualquer questão trabalhista. Porém estas pessoas, contratadas geralmente para serviços de hotelaria e gastronomia nos cruzeiros, não são considerados como tais, por mais que trabalhem embarcadas. Muitas vezes nem sequer eles próprios veem a si mesmos como “trabalhadores”. Ou seja, não têm uma organização sindical.
 
-Existe alguma regulamentação local sobre este assunto?
-Há uma ordenança mas é muito geral, porque estabelece que qualquer embarcação que permaneça por mais de 60 dias corridos em águas brasileiras deve se sujeitar às nossas leis trabalhistas.
 
A realidade é que quando está perto de vencer o prazo, os cruzeiros vão dar uma volta por Montevidéu, passam por Punta del Este, se ausentam dois ou três dias e recomeçam a contagem do zero. Dão um jeitinho, encontram um artifício para burlar o cumprimento da lei.
 
-Não há um Convênio da OIT sobre o trabalho no mar?
-Há e o Brasil o assinou em 2006, entretanto o Poder Executivo nunca o enviou ao Congresso para sua ratificação, e as autoridades garantem que não o fizeram porque  “extraviaram” o documento e parece que não querem admitir isto publicamente.
 
Este Convenio estabelece que quem trabalha sobre um barco, e durante o tempo em que estiver trabalhando no mesmo, é um trabalhador marítimo, seja ele músico, cozinheiro, médico, garçom ou faxineiro.
 
As empresas burlam isto dizendo que são trabalhadores eventuais. Só que isto não exclui as suas condições de trabalhadores marítimos. Principalmente considerando que estes contratos costumam ser por seis ou doze meses, alguns até mesmo mais extensos.
 
-Quais os passos dados para encontrar uma solução?
-Recentemente estivemos reunidos com Antonio Fritz, secretário regional da Federação Internacional dos Trabalhadores do Transporte  (ITF Américas), com quem participamos de uma atividade junto à Federação de trabalhadores do mar.
 
-Em que consistiu esse encontro?
-O senador Paulo Paim, presidente da Comissão dos Direitos Humanos da Câmara Alta, mostrou seu interesse em abordar este tema e nos recebeu junto com uma delegação da Federação e familiares de vítimas deste sistema escravagista.
 
Houve momentos muito emotivos porque escutamos vários testemunhos de pais e de irmãos desses jovens envolvidos, que denunciavam o sofrimento moral intenso e a exploração a que seus familiares foram submetidos enquanto trabalhadores dos cruzeiros.
 
O resultado foi muito bom porque o senador Paim decidiu realizar, em curto prazo, uma audiência pública da Comissão do Senado para abordar o problema.
 
De nossa parte, já tivemos um encontro preparatório para essa audiência, da qual participaram aqueles que haviam se reunido com o Paulo Paim e os representantes do Ministério do Trabalho, encarregados do controle oficial do setor, e da OIT. Ali se decidiu unir esforços para obter-se, finalmente, a ratificação do Convenio da OIT relativo a este assunto, e ser apresentado um projeto de lei no Congresso para regulamentar o setor.
 
Quero destacar a presença, em todo este processo, da ITF Américas e da Federação  Nacional dos Trabalhadores em Transportes Marítimos e Afins do Brasil.
 
Ali estão os marinheiros com sua longa e combativa trajetória como Sindicato. Eles sabem o que acontece nestes cruzeiros e seu testemunho e experiência serão fundamentais.
 
 
explotacion cruceros-610
 Ilustração: Allan McDonald | Rel-UITA
 
Rel-UITA
25 de fevereiro de 2013

Publicado por Darío Falero

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