-A situação que o sindicalismo brasileiro atravessa, se deve unicamente à reforma trabalhista?
-A reforma afetou negativamente todo o espectro sindical, mas seria mentira dizer que é a única responsável pela crise que o movimento vive.
O fato de os dirigentes sindicais terem se acomodado também tem muito que ver com a situação em que estamos hoje.
Era tudo muito fácil. O dinheiro entrava, trabalhando ou não, estando perto de nossos representados ou não. Nós fomos nos acomodando e hoje pagamos caro por esta atitude.
Perdeu-se a atitude militante, perderam-se os líderes que podiam capacitar e formar novos sindicalistas, em especial, os jovens, porque os dirigentes se distanciaram das bases.
Além disso, nós estamos enfrentando um mundo novo, com novos desafios, novas expectativas. Os jovens e as mulheres já não acreditam no sindicato com a fé e a convicção dos antigos militantes, provenientes dos diversos movimentos sociais, e que foram protagonistas nas décadas de 60 e 70.
Por outro lado, na época da ditadura era sabido quem era de direita e quem era de esquerda. Hoje não. Você vê um deputado ou um senador que um dia toma uma medida em prol da classe operaria e no outro uma em contra, ou seja, fazem aquilo que mais lhes convêm.
-Haveria outra expectativa com relação ao poder de mobilização dos sindicatos nesta questão da reforma?
-Esperava-se que houvesse uma atitude mais combativa, principalmente por parte das centrais sindicais que mais poder econômico têm, especificamente três delas.
Pensávamos que iam utilizar esses milhões que receberam do imposto sindical, para financiar movimentos, campanhas e ações que buscaram derrocar o projeto de reforma trabalhista.
Os sindicatos se calaram, acreditando que essa reforma não ia passar. E, se passasse, que o Michel Temer vetaria. Ficamos esperando um pelo outro, o sindicato pela federação, esta pela central e aqui estamos, sem o pão e sem a torta.
Falhamos como movimento sindical, não fizemos o que tínhamos que fazer: ir para Brasília e, se fosse necessário, invadir o Supremo e quebrar tudo.
Para sair disto, teremos que renascer de nossas cinzas, nos reinventar, de forma que o trabalhador e a trabalhadora sejam o nosso propósito, a nossa guia.
Manter um diálogo permanente e sincero será a única forma de que voltem a confiar na organização sindical.
-O que está acontecendo com a participação da mulher no sindicalismo?
-Esta é uma questão que ainda não está clara. Se por um lado, avançamos desde o início no sindicalismo, foi uma luta árdua chegar, dentro de nossa Federação, aos 50 por cento de presidentes homens e 50 por cento mulheres.
Nos levou 10 anos chegar a essa paridade, mas isto acontece na minha federação. Regional ou nacionalmente ainda falta muito para conseguirmos uma verdadeira participação das mulheres nos âmbitos de decisão das organizações sindicais e nos âmbitos de negociação coletiva.
Há que entender que a desigualdade salarial afeta enormemente a participação das mulheres nos sindicatos e só quando se termine com essa diferença e as mulheres ganharem salários dignos, poderão ter outra autonomia e participar mais e melhor.
A ausência de jovens nos quadros sindicais é outro tema que preocupa.
-O que os sindicatos têm que fazer para atrair a juventude?
-Acredito que deveríamos investir mais em informação e em tecnologia, ser conscientes de que dentro de uma ou duas décadas, muitos ofícios e profissões tenderão a desaparecer.
Há que abrir os sindicatos às novas profissões, ampliar o leque de ações para poder captar esses novos e jovens profissionais.
Eu não acredito que os jovens não queiram trabalhar, como se diz desde diversos lugares. Querem fazer alguma coisa que gostem, que entusiasme, nada mais. Será preciso se adaptar a isso.
Temos que apostar nas mulheres e nos jovens, para construir um país melhor e mais igualitário.
-Os dirigentes que ficam metidos num escritório, terão agora que sair das quatro paredes?
-Sem dúvida. Agora que não há recursos, muitos inclusive irão embora mesmo, porque muitos dos que continuam nas organizações já estão aposentados.
No curso de hoje de manhã, eu disse isso. Não sou contra as pessoas de idade avançada, mas devem entender que é preciso dar espaço para os jovens, porque precisamos fazer muito mais, sair das paredes do sindicato e ir para as ruas em busca dos trabalhadores e das trabalhadoras, com seus problemas.
Toda a sua gestão esteve dirigida em satisfazer os próprios interesses. E agora em que o dinheiro não entrará mais facilmente, como acontecia antes da reforma, certamente não esperarão muito para abandonar os seus cargos.
Conheço três dirigentes que já deixaram suas federações e sindicatos.
Melhor assim, os fracos e sem consciência de classe são os primeiros em abandonar o barco quando este dá sinais de que pode vir a afundar, mas acreditamos que há chances de começar de zero, se for necessário, e tomar um novo rumo.
-Apesar da conjuntura adversa, noto em você o entusiasmo e a força de quem sempre luta, o que não é fácil de observar hoje...
-(Risos) Acredito haver uma diferença substancial entre ser sindicalista e ser dirigente sindical.
Eu sou uma sindicalista nata, nasci com isto no sangue. Sempre senti essa necessidade de ajudar e de melhorar a vida dos demais.
Eu vou te contar uma história. Quando eu tinha 13 anos, a única coisa que sabia dos Alcoólicos Anônimos era que ali ia gente que consumia muita bebida alcoólica, então, todo mundo que eu via nas ruas alcoolizado, eu levava até eles.
Devemos continuar trabalhando independentemente da conjuntura, e a atual, exige uma nova militância, porque o único lugar do mundo onde o dinheiro vem antes do trabalho é no dicionário.
Se querem recursos, então terão de trabalhar. Simples assim. Temos que sair deste poço depressivo com trabalho e coragem.
Não há opção.
-Parabéns! Que assim seja!
Em Limeira,
Gerardo Iglesias