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“O Estado é o principal violador dos direitos humanos no Brasil”

A corrupção incrustrada no sistema político brasileiro, os retrocessos históricos dos direitos trabalhistas e sociais, as violações permanentes dos direitos humanos, orquestradas pelo próprio Parlamento, além das infinitas situações surreais vividas pelos brasileiros, fazem parte do nosso cotidiano, disse Jair Krischke, assessor em direitos humanos da Rel-UITA e presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos de Porto Alegre (MJDH).

“Estamos vivendo abusos nunca antes vistos. Conquistas de longa data, já consolidadas, estão sendo desmanteladas por um pequeno grupo que domina o Congresso Nacional”, disse Jair ao ser consultado pela Rel durante a comemoração do Dia Internacional dos Direitos Humanos, em 10 de dezembro passado.

Para ilustrar este panorama, usou como exemplo a ministra de Direitos Humanos, Luislinda Valois, por ter enviado ao governo pedido para acumular salário de ministra com a aposentadoria de desembargadora, o que lhe garantiria vencimento bruto de R$ 61,4 mil.

A intenção de Valois era receber ambos os salários todos os meses, entretanto o valor ultrapassaria o teto do funcionalismo, que é de R$ 33.700.

“O absurdo foi a ministra citar trabalho escravo ao afirmar que “o trabalho executado sem a correspondente contrapartida, a que se denomina remuneração, sem sombra de dúvida, se assemelha a trabalho escravo”.

Além disso, Valois tentou também justificar sua pretensão por receber mais de 60 mil reais por mês, perguntando-se: “Como vou fazer para comer, como farei para beber, como farei para me calçar?”

Ela quer ganhar em um mês o que um trabalhador ganharia após cinco anos e meio de trabalho. O salário mínimo no Brasil é de R$ 937. E esta senhora continua sendo ministra”, exclama Jair com uma expressão de incredulidade e tristeza na voz.

A situação já por si é surreal, mais ainda se consideramos o momento atual, onde o governo modificou o que se entende por trabalho escravo.

Em outubro o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, entrou com uma portaria modificando substancialmente o conceito de trabalho escravo, limitando-o a apenas situações de privação de liberdade, deixando de fora outras situações graves para as trabalhadoras e os trabalhadores, como o trabalho degradante e as jornadas extenuantes.

“Imagine o que acontecerá em um país com, atualmente, mais de 14 milhões de desocupados. Eles possivelmente estarão dispostos a aceitar qualquer tipo de trabalho. E aqueles com trabalho? Possivelmente aceitem fazer de tudo para não perderem o trabalho, com medo da fome”, destacou o presidente do MJDH.
 
É exatamente por tudo isso que acontece hoje no Brasil que o trabalho das organizações sindicais é fundamental”, advertiu ele.

Milhares de brasileiros assassinados
E ninguém diz nada

Por outro lado, Krischke denuncia o fato de no Brasil estar havendo um verdadeiro massacre, silenciado pela mídia. “São cometidos 60 mil assassinatos por ano, e grande parte dessas mortes são causadas por agentes do Estado. O Estado é o principal violador dos direitos humanos no Brasil”, denunciou.

Para o ativista e assessor da Rel-UITA, os integrantes do Congresso brasileiro, por meio de suas bancadas, são a principal origem das sistemáticas violações dos direitos humanos e da crescente violência, protegidas e incentivadas ambas pela impunidade.

“A bancada da bala (indústria armamentista e militares), a bancada do boi (latifundiários e agronegócio) e a bancada da Bíblia (o setor mais conservador da igreja evangélica) são as minorias que pressionam para que votem leis à sua medida. O governo de Temer, por outro lado, precisa dessas bancadas para votar as reformas que propõe. Ou seja, eles se retroalimentam”, disse Krischke.

A reforma trabalhista – já aprovada – e a da Previdência, que está para ser votada nos próximos dias, são claramente violadoras dos direitos fundamentais do ser humano, incluiu.

“O Congresso também quer privatizar empresas públicas cruciais para o desenvolvimento econômico do país e anistiar as multas das grandes empresas que destroem o meio ambiente, desmatando a Floresta Amazônica e expulsando os povos indígenas de suas terras originárias, estes as principais vítimas da violência que, amparada pelo Estado, joga-os em uma enorme condição de vulnerabilidade.

Estes são apenas alguns dos casos mais flagrantes de violação dos direitos humanos. Há tantos e muitos mais”, concluiu o ativista.