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CONTAG e FLAI: duas organizações irmãs

Sinergias sindicais e combate ao neofascismo

Gerardo Iglesias

01 | 12 | 2023


Andrea Coinu e Alberto Broch | Foto: Gerardo Iglesias

Neoliberalismo e terrorismo econômico são duas faces da mesma moeda. A onda neofascista global imprime novas fórmulas de repressão, disciplinamento da força de trabalho e ataque direto às organizações sindicais em todo o mundo. Este cenário nos desafia, pois requer de uma análise profunda e nos exige avançar na acumulação de forças, robustecer e reinventar as dinâmicas do internacionalismo do movimento operário e da solidariedade de classe. A FLAI e a CONTAG, em parceria com a UITA, estão trilhando este caminho.

A FLAI é a Federação dos Trabalhadores da Agroindústria da confederação CGIL1, a maior na Itália. Tem suas raízes na Federterra, a Federação Nacional dos Trabalhadores da Terra, o primeiro sindicato de trabalhadores agrícolas da Europa, fundado em Bolonha em 1901.

Durante a segunda metade do século XX, começou um processo de articulação com as organizações que representavam os trabalhadores rurais na indústria alimentícia, levando à sua unificação no final dos anos 80 e à criação do Congresso fundacional da FLAI, em janeiro de 1988.

Além disso, a Confederação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras da Agricultura (CONTAG) celebrará os 60 anos de sua existência em 22 de dezembro de 2023.

Constituída em 1963, a CONTAG foi uma protagonista na resistência do povo brasileiro e da classe trabalhadora contra a ditadura militar (1964 - 1984). Nas últimas décadas, a nossa filiada se destacou na luta pela reforma agrária e pelo desenvolvimento de um modelo produtivo sustentável e solidário.

Coordenação de capacidades

Juntas, CONTAG e FLAI CGIL tiveram a ideia de explorar fórmulas de cooperação com o objetivo de articular ações que permitam o fortalecimento das ações sindicais e uma maior incidência política na transformação do setor agroalimentar.

Os desafios e as problemáticas são comuns para ambas as organizações, que se destacam internacionalmente por seu vasto histórico de lutas em prol da dignificação do trabalho e da vida rural.

Arístides Santos e Alberto Broch, respectivamente presidente e vice-presidente da CONTAG, e Pietro Ruffolo, ex-coordenador de políticas europeias e internacionais da FLAI CGIL, estabeleceram os primeiros contatos em diferentes âmbitos de atuação da UITA. Atualmente, o jovem dirigente Andrea Coinu ocupa o cargo de Ruffolo, já aposentado.

Uma extrema-direita a ser combatida a todo vapor

Além do âmbito sindical, a cooperação entre ambas as organizações ganha relevância ao examinar o contexto global adverso, com alta volatilidade em termos políticos e econômicos, onde as estruturas partidárias referentes ao movimento operário vêm sofrendo profundos giros ideológicos.

Alberto Broch alertava em 2021, dois anos após o início do governo de Jair Bolsonaro: “Não teremos democracia nem liberdades sindicais sob um regime neofascista. O mais preocupante é que nos Estados Unidos, no Brasil, na Europa, muitos trabalhadores e trabalhadoras votam em candidatos populistas de extrema-direita”.

Diante da investida do neofascismo no cenário internacional e do novo panorama de devastação social e política com apoio popular, Broch clamava “pela necessidade de construir na UITA uma plataforma de troca e diálogo, visando a definir e desenvolver estratégias de resistência”.

Em outubro de 2022, em um editorial para a UITA, Giovanni Mininni, secretário-geral da FLAI, recordava o atentado da extrema-direita contra a sede central da CGIL2.

“Há um ano, fomos testemunhas do devastador ataque à sede de nossa confederação em Roma, uma ação direcionada não só contra a maior organização da Itália e da Europa, como também contra a própria democracia”, enfatizava Mininni.

Em sintonia com o vice-presidente da CONTAG, o dirigente destacava: "Nosso país enfrenta atualmente uma alarmante ascensão da extrema-direita. Na Itália, está se formando um clima preocupante. Os problemas de trabalho, moradia e perda de direitos sociais são constantemente utilizados para alimentar a ira das pessoas. Os sindicatos —dizia o secretário-geral— são apontados pela extrema-direita como a causa das dificuldades sociais e econômicas".

Em outras palavras, enquanto as esquerdas se mimetizam no cenário liberal, é preciso reconhecer a habilidade que o neoliberalismo tem de transferir para outros a desordem social e econômica que suas próprias políticas geram. É escopeta responsabilizando a perdiz pela própria morte.

Outras vozes se unem

Posteriormente, na reunião do Comitê Executivo da UITA (Genebra, 19 e 20 de outubro de 2022), Peter Schmidt, da Federação de Alimentos da Alemanha (NGG), e Héctor Morcillo, da Federação de Alimentação da Argentina, alertaram enfaticamente sobre a crescente investida autoritária tanto na Europa quanto na América Latina, destacando as precauções recomendadas pela UITA.

Morcillo enfatizava o perigo da escalada ultraconservadora na Argentina com a expressão certeira “Vienen por nosotros” (Eles vêm por nós), cunhada pelo advogado trabalhista Lucio Garzón Maceda, que há anos alerta que será necessário “ser mais inteligente e usar a força da mobilização para enfrentar o que está por vir”. Em 2022, ninguém imaginava o pior: que Javier Milei seria eleito presidente da Argentina.

Na VII Conferência do Grupo Profissional de Trabalhadores da Agricultura (GPTA, Genebra, 7 e 8 de novembro de 2022), ocorreu o primeiro encontro entre Alberto Broch e Andrea Coinu, surgindo daí uma extraordinária empatia política.

Naquela conferência, a Rel UITA, a FLAI e a CONTAG seguiram a liderança de Peter Schmidt e Héctor Morcillo, cerrando fileiras sobre a inabalável necessidade de compreender e enfrentar a investida neofascista global, promovendo um amplo debate sobre a futura orientação do movimento sindical e da própria democracia.

Sem dúvida, essa atividade foi fundamental para o posicionamento sobre esses temas relevantes na arquitetura do 28º Congresso da UITA (Genebra, de 13 a 16 de junho de 2023).

A última reunião do Comitê Diretor do GPTA (Eastbourne, Reino Unido, 12 e 13 de setembro) representou uma nova oportunidade de encontro e ajuste do enfoque programático de cooperação entre ambas as organizações no cenário sindical e político.

Dando continuidade a essa convergência de visões e interesses, essas duas organizações, CONTAG e FLAI, propõem estabelecer a curto prazo um plano de ação conjunto, adaptado às suas particularidades locais, para dar continuidade prática ao trabalho de reflexão e análise que elaboraram, delineando um caminho claro a ser percorrido em conjunto.


1 - Confederação Geral Italiana do Trabalho
2 - 21 de outubro de 2021.