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Sindicatos planejam ações contra mudanças em regras de saúde e segurança do trabalho

Norma que estabelece critérios de proteção aos trabalhadores de frigoríficos e direito à pausa térmica estão em risco.
Foto: Divulgação

Entidades sindicais e trabalhadores do setor de alimentação planejam mobilizações para barrar propostas de setores empresariais e do governo para a revisão de leis e normas de saúde e segurança do trabalho.

Uma das principais frentes em disputa envolve mudanças na Norma Regulamentadora 36 (NR36), que define requisitos para o controle, monitoramento e avaliação dos riscos nas indústrias de abate e processamento de carnes e derivados, para garantir a segurança, a saúde e a qualidade de vida no ambiente de trabalho.

Empresários do setor de abate e processamento de carnes e derivados sugeriram ao governo Bolsonaro, entre dezembro de 2020 e fevereiro de 2021, uma série de mudanças na Norma Regulamentadora (NR) 36, que estabelece protocolos de saúde e segurança para os trabalhadores de frigoríficos.

A norma foi assinada em 2013, durante o governo Dilma Rousseff (PT), por meio da portaria nº 555 do extinto Ministério do Trabalho e Emprego, e consolidou avanços na prevenção de acidentes e adoecimentos no setor.

“Excesso de burocracia”, “insegurança jurídica” e “aumento dos custos na operação” são alguns dos argumentos apresentados por entidades empresariais ao governo federal para reduzir os direitos e garantias trabalhistas.

Limite de intervalo

Outra frente de retrocesso voltou a ser debatida na última segunda (29), quando o Congresso Nacional retomou as discussões do projeto de lei (PL) nº 2363, de 2011, criado pelo ex-deputado federal e empresário, Silvio Costa, na Comissão de Trabalho, Administração de Serviço Público da Casa (CTASP).

A proposta pretende alterar o artigo 253 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que aborda os serviços frigoríficos.

Caso o texto seja aprovado, as indústrias passarão a considerar como câmara fria apenas ambientes com temperatura inferior a 4°C, limitando o direito a intervalos durante a jornada de trabalho, as chamadas “pausas térmicas” de 20 minutos, e o adicional de insalubridade para empregados que atuam na área.

Após 1h40 de trabalho dentro de câmaras frigoríficas, as pausas são necessárias para recuperar o organismo do trabalhador e evitar adoecimentos futuros.

De acordo com nota técnica assinada no último dia 22 por cinco procuradores do Ministério Público do Trabalho (MPT), a medida representa um “profundo retrocesso social, em violação aos arts. 6º, 7º e 196 da Constituição Federal que asseguram a saúde como direito fundamental das trabalhadoras e dos trabalhadores.”

“Nos frigoríficos de aves, bovinos e suínos, dentre outros, somente os setores de expedição e paletização apresentam temperaturas iguais ou inferiores a 4ºC e contam com trabalhadores que movimentam mercadorias, setores que não chegam a empregar 5% do total de empregados em uma planta frigorífica”, diz o texto.

Os cinco procuradores lembram que a atividade frigorífica é a que mais gera acidente e adoecimentos ocupacionais na indústria brasileira, segundo o Anuário Estatístico de Acidentes do Trabalho da Previdência Social.

Considerando que, sem contar com o elevado número de subnotificações, a atividade econômica em comento foi responsável por gerar mais de 22 mil acidentes de trabalho e doenças ocupacionais no Brasil, a alteração legislativa proposta configura um profundo retrocesso social, em violação aos artigos 6º, 7º e 196 da Constituição Federal que asseguram a saúde como direito fundamental dos trabalhadores e trabalhadoras”, completa a nota.

O PL vai ao encontro das propostas de empresários ligados à Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) e a Confederação Nacional da Indústria (CNI), que representam empresas como JBS, BR Foods (BRF) e Minerva.

Mobilizações

A Confederação Brasileira Democrática dos Trabalhadores nas Indústrias da Alimentação (Contac-CUT), a Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação (CNTA Afins) e a União Internacional dos Trabalhadores da Alimentação (UITA) planejam ações para resistir às mudanças, realizando articulações nacionais e internacionais para barrar o avanço empresarial sobre os direitos assegurados.

“Além das audiências públicas que já iniciamos nos estados, estamos organizando audiências municipais em todas as cidades onde houver um frigorífico instalado”, explica o secretário de Finanças da Contac-CUT, Josimar Cecchin.

“Também vamos discutir o assunto em Brasília e intensificar nossas mobilizações nas portas de fábrica. Em todos esses espaços, as manobras dos empresários serão denunciadas e reportadas a instâncias internacionais”, afirma.

“É inadmissível que no momento em que a curva de contaminação pelo novo coronavírus aumenta, que os números de mortes são assustadores e já não existem vagas suficientes nos hospitais, os patrões queiram discutir uma medida que irá adoecer os trabalhadores”, completa Nelson Morelli, presidente da Contac-CUT.

Os empresários entendem que as pausas nos frigoríficos causam atrasos na produção e, consequentemente, atrapalham os lucros, explica o presidente da CNTA Afins, Artur Bueno Camargo.

“Esta questão já era polêmica desde que a gente discutiu a viabilização da NR36. Eles já não aceitavam a quebra da velocidade da produção, mas sempre explicamos que isso significa qualidade no desenvolvimento do trabalho como um todo e na saúde dos trabalhadores pensando a longo prazo”, diz.

Em abril, as entidades sindicais organizam audiência pública nacional na Comissão de Trabalho da Câmara de Deputados. Na última terça-feira (30), a Contac-CUT, a CNTA Afins e a UITA enviaram um ofício ao presidente da Câmara federal, Arthur Lira, solicitando o arquivamento do PL 2363, de 2011.

Outro ofício foi encaminhado ao secretário de Trabalho do Ministério da Economia, Bruno Dalcolmo, e ao ministro da Economia, Paulo Guedes, exigindo a retirada de pauta da revisão da NR-36.