A Europa bloqueará produtos fabricados com trabalho escravo e sancionará empresários
Na semana passada, o Parlamento Europeu aprovou normas que impedirão o acesso a seus mercados de produtos elaborados com trabalho escravo e obrigarão as empresas a prestarem contas.
Daniel Gatti
2 | 5 | 2024
Imagen: Allan McDonald
Por um lado, os 27 países da União Europeia se comprometem a não admitir nenhum produto fabricado com trabalho análogo à escravidão; por outro, incorporaram a suas legislações disposições das Nações Unidas sobre a responsabilidade social das empresas nesta matéria.
“Empresas e setores econômicos inteiros terão que fazer a partir de agora um sério esforço para garantir o respeito aos direitos humanos em toda a cadeia de abastecimento”, disse a eurodeputada liberal holandesa Samira Rafaela, poente dos dois textos aprovados.
Wies Willems, especialista em matérias-primas na América Latina da Rede Eu-Lat, disse ao meio de comunicação alemão Deutsche Welle que essas novas leis “podem significar uma mudança de paradigma em direitos humanos e respeito ao meio ambiente nas cadeias de valor das empresas europeias".
"Nós conseguimos incluir algumas disposições, como o acesso à justiça das vítimas e a responsabilidade civil em casos de violações por parte das empresas, mas também existem algumas limitações", disse este consultor de empresas e direitos humanos da organização belga BroederlijkDelen.
Entre as limitações afirmou que as novas normas não são aplicáveis ao setor financeiro.
“Também não é bom que somente as empresas com mais de mil funcionários” estejam envolvidas. Ou que “a empresa somente tenha que assumir responsabilidade se for comprovado que não cumpriu intencionalmente ou por negligência; se o dano foi causado por seus parceiros comerciais, ela não tem responsabilidade".
Uma boa notícia para as vítimas é que elas poderão recorrer ante tribunais europeus para serem indenizadas por terem sido submetidas a trabalhos análogos à escravidão, afirmou Willems.
"É um avanço", disse, porque a grande maioria dessas pessoas, que trabalham geralmente em setores como a agricultura, a mineração e diversas atividades extrativistas, não tem acesso à justiça em seus países.
"É possível que esteja se abrindo também o caminho em direção a um tratado internacional vinculativo sobre empresas e direitos humanos", acrescentou o ativista belga.
Um documento elaborado em conjunto entre a Organização Internacional do Trabalho (OIT), a Organização Internacional para as Migrações e a ONG Walk Free indica que 86 por cento dos casos de trabalho forçado no mundo todo envolve atores privados.
Assinala também que os países do G20 “importam anualmente 468 bilhões de dólares em produtos com alto risco de terem sido fabricados sob trabalho forçado”.
O relatório “Estimações mundiais sobre a escravidão moderna” apresentado na Conferência Internacional do Trabalho, organizada pela OIT em junho de 2023, calcula, aproximadamente, um total de 28 milhões de pessoas submetidas a trabalho forçado.
"A retenção sistemática e deliberada do salário, utilizada pelos empregadores abusivos, para obrigar os trabalhadores a permanecerem em um posto de trabalho por medo de perder a renda acumulada, é a forma mais comum de coação, experimentada por 36% das pessoas em situação de trabalho forçado", diz o texto.
Uma pesquisa feita em 2014 pela OIT estabelecia que o lucro gerado através do trabalho forçado e recebido por toda a cadeia de empresas envolvidas era, no mínimo, de 150 bilhões de dólares.
Na América Latina, os trabalhadores e as trabalhadoras nessa situação ultrapassariam 1,2 milhões, com pontos altos na América Central e no Brasil.