Brasil | SINDICATOS | MEMÓRIA
Com María Inés Lorenzi Vian
“O sindicato está no meu sangue”
Maria Ines está no movimento sindical há 34 anos, desde aquele dia em que entrou no Sindicato dos Trabalhadores da Alimentação da cidade de Encantado. Participou do Programa de Educação da Federação dos Trabalhadores da Alimentação do Rio Grande do Sul e da UITA −referência histórica do sindicalismo brasileiro−. Com o passar dos anos, suas feições italianas se acentuaram e, embora preocupada com um problema de saúde, seu sorriso jovial
continua indestrutível.
Gerardo Iglesias
04 | 08 | 2022
María Inés Lorenzi Vian | Foto: Gerardo Iglesias
-Como você está? Tantos anos sem a gente se ver!
-A última vez que nós nos vimos você estava em Encantado com Siderlei (Silva de Oliveira) e visitamos a empresa Baldo…
-Famosa pela sua erva-mate marca Canárias e porque toda a sua produção vai para o Uruguai...
-Isso mesmo! E já faz muitos anos... desde a última vez que nos vimos.
-Você vem da velha guarda da Federação, daqueles anos gloriosos. Você vê alguma diferença entre o sindicalismo dos anos 80, quando você começou, e o atual?
-Muita. Estamos falando de outra época e de outra geração, totalmente diferente. Eu percebo a juventude de hoje mais apática em relação à organização sindical. Naquela época, o sindicato era um espaço de luta contra a ditadura, um ponto de encontro para a juventude.
Os jovens da minha época eram mais inquietos porque queriam saber mais, conhecer mais. Lembro que fazíamos cartilhas e revistas, onde divulgávamos muita informação sobre os assuntos mais variados.
-Pensei agora na coleção “Primeiros passos”, da editora Brasiliense, e na nossa ânsia por entender as engrenagens político-sociais.
-Todo mundo tinha um daqueles livrinhos! Hoje as novas tecnologias ocupam todos os espaços, há mais acessibilidade, mas a energia de transformação foi perdida, por isso temos dificuldades em atrair os jovens, em fazê-los se integrarem e formarem parte do sindicato.
-O programa de educação ministrado por nós naquela época soube capitalizar bem esse entusiasmo juvenil. Você acha que hoje poderia ser implementado algo parecido?
-Acho que sim. E seria bem-vindo! Aliás, por que não recomeçar com a gurizada?
-Talvez o problema não esteja nos jovens, mas nas organizações sindicais...
-Talvez a responsabilidade não seja toda da juventude, é certo. O problema é que os sindicatos não estão sabendo bem por onde começar, nem como começar. Não estamos sabendo de que jeito convocar os jovens.
Por enquanto não estamos encontrando a maneira, então talvez um programa de educação seja uma estratégia para reunir jovens e mulheres, outro segmento que é difícil de cooptar.
-Vi aqui no sindicato uma sala cheia de roupas e utensílios. Do que se trata?
-É um trabalho comunitário que fazemos no sindicato. Recebemos doações tanto de roupas quanto de qualquer utensílio ou eletrodoméstico que esteja em condições de ser reciclado.
Selecionamos e organizamos o que vai chegando e isso fica o ano todo para quem precisar.
As doações antes terminavam geralmente nas mãos de nossos filiados, mas ultimamente vemos que outras pessoas da comunidade estão vindo buscá-las também.
Temos uma presença grande de migrantes na cidade. Há muitos haitianos, venezuelanos, dominicanos trabalhando nos frigoríficos que vêm de regiões com temperaturas quentes e, então, sentem muito frio. Daí eles vêm e levam agasalhos, para dar um exemplo.
Construímos um sindicato aberto à sociedade.
-O que o sindicato significa para você?
-Que pergunta!!! (Maria Ines sorri, pensa) É parte da minha vida, está no meu sangue!
Como seria bom voltar àqueles debates acalorados, à troca de ideias, à construção coletiva! Se hoje me perguntassem se eu voltaria ao sindicato, eu responderia que sim, sempre. Sem hesitar por um segundo, ela garante.