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Meu Milei, meu Milei, que boca tão grande você tem!

Carlos Amorín

24 | 10 | 2023


Foto: Gerardo Iglesias

O recente primeiro turno das eleições presidenciais na Argentina confirmou uma regra de ferro: é um país imprevisível. Lá, nesse território de realismo mágico, certamente o próximo Gabriel García Márquez está por surgir.

É o país com o maior número de prêmios Nobel na América Latina, um nível de excelência acadêmica reconhecido internacionalmente, uma nação rica, imensamente rica, com uma população terrivelmente empobrecida, um dos maiores índices de sindicalização do continente, berço de mitos eternos como Juan Domingo Perón e Evita, Ernesto Che Guevara, René Favaloro, Jorge Luis Borges, Mercedes Sosa, Charly García, Diego Armando Maradona, Lionel Messi, o Papa Francisco e, como se não bastasse, o contrafilé.

E como toda regra tem sua exceção, surgiu Javier Milei, o homem com «a língua mais rápida do oeste», que falou, insultou, desqualificou, ameaçou, prometeu, mentiu, gritou, gritou e gritou em nome da «liberdade», mas com uma motosserra gigante nas mãos, com a qual ele pretende cortar tudo o que – segundo ele – é supérfluo para o Estado, a sociedade e o Deus Mercado.

E lá se vão os direitos, os trabalhistas, os humanos, os sociais, os de gênero, os ambientais, os étnicos e culturais, ladeira abaixo graças a essa gigante motosserra. Chamam isso de «nova direita», mas no meu bairro chamamos isso há muito tempo de «neoliberalismo» e também de «neofascismo».

Neste primeiro turno, houve uma clara maioria. Ferida, sem dúvida, abalada, reduzida, certamente cansada, à beira do desespero, mas mesmo nessas condições, essa maioria resgatou a dignidade histórica de sua experiência política e social, ouviu a voz que vem de baixo, das entranhas, da intuição alerta e certeira, da consciência de classe que corre nas veias, e essa maioria rejeitou as pantomimas e fogos de artifício que ocultam o lixão que Milei se propõe a impor.

Nem tudo está ganho, nem tudo está perdido. E se o resultado for confirmado no segundo turno, será a hora em que os líderes políticos argentinos se calem, escutem, escutem novamente e aprendam com seu povo.