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Justiça do Trabalho concede liminar obrigando Seara/JBS a notificar os acidentes de trabalho

Decisão foi proferida em ACP ajuizada pelo MPT após fiscalização realizada neste ano expor subnotificação em massa na empresa, com 3.573 acidentes e doenças do trabalho não informados.

Portal do MPT

15 | 10 | 2025


Foto: FTIA RS

A Vara do Trabalho de Frederico Westphalen (RS) concedeu liminar em Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) contra a Seara Alimentos Ltda, determinando uma série de medidas de cumprimento imediato para combater a subnotificação de acidentes e doenças do trabalho na unidade da empresa em Seberi (RS).

A decisão, proferida em 13 de outubro pela juíza do Trabalho Fabiane Martins, impõe obrigações rigorosas sob pena de multa de R$ 50 mil por obrigação descumprida e R$ 5 mil por trabalhador prejudicado.

A ação é de autoria das procuradoras do Trabalho Amanda Bessa Figueiredo e Priscila Dibi Schvarcz e dos procuradores Alexandre Marin Ragagnin e Pedro Guimarães Vieira.

A decisão da Justiça do Trabalho atendeu ao pedido do MPT de tutela de urgência antecipada, com obrigação de cumprimento imediato, para evitar danos irreparáveis enquanto o processo segue seu curso e o mérito não é julgado.

As obrigações

Ficam estabelecidas pela liminar 10 obrigações a serem cumpridas pela Seara para sanar a cultura de subnotificação de acidentes na empresa, entre elas a obrigação de emitir CATs (Comunicação de Acidente de Trabalho) para todos os acidentes e suspeitas de adoecimento relacionados ao trabalho, independentemente de afastamento ou duração; a de notificar ao SINAN (Sistema de Informação de Agravos de Notificação) casos de doenças e agravos relacionados ao trabalho; a de avaliar atestados médicos sem CID (Código Internacional de Doenças) para garantir registro adequado e a devida gestão em saúde na unidade.

Pela decisão, a Seara também fica obrigada a investigar acidentes e doenças com análise clínica e organizacional, sob responsabilidade de médico do trabalho, e a garantir participação efetiva da CIPA (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e de Assédio) nas investigações.

A empresa também deve, em um prazo de 20 dias, reavaliar riscos ocupacionais e revisar medidas de controle quando constatada insuficiência, bem como oferecer aos integrantes da CIPA curso de capacitação sobre o Método de Investigação e Análise de Acidentes de Trabalho como disposto nas Normas Regulamentadoras (NRs) do Ministério do Trabalho e Emprego números 1 e 5 – que estabelecem, respectivamente, as disposições gerais sobre segurança e saúde no trabalho no Brasil e os parâmetros e requisitos para composição da CIPA).

Histórico do caso

A liminar decorre de uma ACP ajuizada após fiscalização realizada pela Força-Tarefa dos Frigoríficos do RS entre 2 e 6 de junho de 2025 na unidade da Seara em Seberi.

A inspeção revelou um cenário alarmante: 3.573 casos de subnotificação envolvendo acidentes e doenças do trabalho. Entre as irregularidades flagradas, foram encontrados 83 casos em que a empresa investigou o acidente de trabalho e, mesmo assim, não emitiu a CAT respectiva.

O MPT demonstrou, ainda, que dos 43 benefícios previdenciários em que o próprio INSS reconheceu o nexo com o trabalho (B91), em 41 deles não houve a emissão da CAT, o que representa 95,35% dos benefícios acidentários subnotificados.

Foram demostrados ainda, afastamentos inferiores a 15 dias relacionados ao trabalho sem registro, falhas na comunicação ao SINAN e ausência de prontuários médicos completos. Outro ponto verificado na ação fiscal foi o fato de investigações internas atribuírem 95% dos acidentes de trabalho a unidade a "culpa do empregado", sem análise efetiva das condições de trabalho.

Na ação, o MPT argumenta que o total de 3.573 casos demonstra uma prática sistemática de não emissão de CAT, o que prejudica a compilação de estatísticas oficiais de acidentes/doenças do trabalho, frauda o direito dos trabalhadores à proteção previdenciária e impede as efetivas fiscalização e prevenção de riscos ocupacionais. O MPT também sustenta que a conduta da empresa viola normas nacionais e internacionais, incluindo convenções da OIT sobre ambiente de trabalho seguro e saudável.

Garantias de direitos

A inspeção também resultou na interdição parcial, por risco grave e iminente, da planta da Seara em Seberi, que abate cerca de 5,6 mil suínos por dia e emprega mais de 2 mil trabalhadores.

A empresa firmou Termo de Ajuste de Conduta (TAC) emergencial, prevendo a correção de irregularidades como a do sistema de detecção e prevenção contra vazamento de amônia e medidas contra distúrbios osteomusculares em diversas atividades e setores. A Seara, contudo, se recusou a firmar TAC sobre o restante das irregularidades constatadas, e o MPT ajuizou diferentes ações para garantir a correção de cada uma delas.

Em outras ações civis públicas, o MPT já garantiu também decisões liminares determinando: afastamento emergencial de gestantes de ambientes com ruídos excessivos; a privacidade dos trabalhadores em trocas de uniformes e a interrupção de prática ilegal na concessão do prêmio assiduidade.

O mérito da ação ainda será apreciado pela Justiça do Trabalho. O MPT pede, ao fim do processo, a condenação da Seara ao pagamento de indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 20 milhões, a ser revertido ao Fundo de Reconstituição dos Bens Lesados administrado pelo MPRS.