Brasil | DH | AMAZÔNIA

Resistência indígena diante do despojo e da violência estrutural

Guardiões do nosso futuro

Na vasta imensidão da Amazônia, onde os rios desenham labirintos e as florestas guardam segredos milenares, os povos indígenas enfrentam uma realidade que poucos ousam encarar de frente.

Carlos Amorín

3 | 9 | 2025


Foto: Gerardo Iglesias

Não se trata de uma guerra de armas ou de exércitos formais; é uma guerra silenciosa, letal, travada entre a ganância dos interesses econômicos, a indiferença das instituições e a fragilidade de políticas públicas que prometem proteção, mas raramente cumprem.

O mais recente relatório anual do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) ¹ sobre a violência contra os povos indígenas no Brasil apresenta números e relatos que doem, mas que são essenciais para compreender a magnitude dessa crise.

As palavras e o vento

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva assumiu com promessas de restaurar direitos históricos e proteger os territórios indígenas.

No entanto, os dados são claros: embora oito territórios tenham sido homologados no primeiro ano da nova administração, isso é insuficiente diante dos 276 casos de invasão, exploração ilegal de recursos e danos ao patrimônio cultural e natural em pelo menos 202 terras indígenas, distribuídas em 22 estados do país.

A violência não se limita à terra: atinge também a integridade física e a vida de lideranças comunitárias, defensores de direitos e membros das comunidades, que enfrentam ameaças, intimidações e ataques diretos. Bahia, Mato Grosso do Sul e Paraná se destacam como epicentros dessa escalada de agressões.

Por trás desses números, existem histórias humanas que raramente chegam às manchetes. Famílias expulsas de seus territórios, comunidades inteiras que perdem o acesso a recursos vitais, crianças que crescem entre o medo e a incerteza.

A violência nem sempre é visível, mas deixa cicatrizes profundas: a perda da conexão com a terra, a ruptura da memória cultural e a sensação constante de insegurança. As políticas públicas se dissolvem diante da pressão de interesses privados que buscam explorar madeira, minérios e terras agrícolas a qualquer custo.

O bloqueio midiático

Neste cenário, os meios de comunicação cumprem um papel crítico. A concentração midiática, a dependência de publicidade institucional e a falta de cobertura especializada geram um silêncio cúmplice que amplifica a vulnerabilidade dessas comunidades.

As histórias de resistência, denúncia e luta pelos direitos dos povos indígenas raramente encontram espaço nos grandes veículos de comunicação e, quando o fazem, muitas vezes são apresentadas de forma fragmentada ou descontextualizada. Essa omissão contribui para a invisibilização de uma população que, apesar de tudo, segue defendendo sua terra e sua cultura.

A resistência indígena continua viva. Comunidades organizadas denunciam violações, articulam mobilizações e buscam alianças com organizações nacionais e internacionais. Cada ação é um ato de coragem diante de estruturas que historicamente privilegiaram interesses corporativos e políticos acima da vida e dos direitos coletivos.

Sua luta não é apenas pela terra, mas pela vida, pela dignidade e pela preservação de culturas milenares que, se perdidas, se extinguem para sempre.

Extermínio de baixa intensidade

O relatório do CIMI também evidencia que a violência contra os povos indígenas não é um fato isolado, mas um sintoma de injustiças estruturais no Brasil: a fragilidade institucional, a insuficiência de políticas públicas, a impunidade dos invasores de terras e a persistência de projetos de infraestrutura e exploração de recursos naturais que geram conflitos diretos com as comunidades.

Hoje, o chamado é claro: é necessário que a sociedade civil, as instituições nacionais e internacionais e os meios de comunicação assumam sua responsabilidade.

A defesa dos povos indígenas não é um tema periférico, é central para a construção de um Brasil justo e equitativo.

Sua resistência ilumina um caminho para a proteção dos direitos humanos, o respeito à diversidade cultural e a conservação de um patrimônio natural insubstituível. Ignorar essas vozes não é apenas uma omissão ética — é um risco para toda a sociedade.

Um espelho onde se olhar

Na floresta amazônica, enquanto os rios seguem seu curso e as matas sussurram histórias antigas, os povos indígenas, embora ameaçados, permanecem de pé.
Não há manchete capaz de captar plenamente sua luta, nem estatística que expresse a profundidade de sua dignidade, mas sua resistência é um lembrete constante: a terra, a memória e a vida não se negociam.

Defendê-las é um dever que vai além da política, da geografia ou da economia — é um ato de justiça que define quem somos como sociedade e qual futuro estamos dispostos a construir.

¹https://cimi.org.br/wp-content/uploads/2022/08/resumen-ejecutivo-violencia-pueblos-indigenas-brasil-2021-cimi.pdf