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Caçador de torturadores se une a Nobel da Paz para uma última ofensiva contra agentes da repressão

Jair Krischke e Adolfo Esquivel buscam mover processo contra agentes suspeitos de ligação com sumiço de jornalista em 1971.

Terra.com.br

26 | 01 | 2023


Jair Krischke | Foto: Gerardo Iglesias

Aos 84 anos, o historiador Jair Krischke é o mais longevo caçador de torturadores da América do Sul. Há cinco décadas, ele mantém uma cruzada contra agentes da repressão das ditaduras que marcaram a vida política e social dos países do continente entre 1960 e 1980. Agora, o ativista gaúcho vive a expectativa do que pode ser sua última grande investida contra um grupo acusado de violações de direitos humanos.

Krischke se uniu ao ativista argentino Adolfo Pérez Esquivel, Nobel da Paz, para mover na Justiça do país vizinho um processo contra agentes da repressão suspeitos de ligação com o desaparecimento do jornalista paulista Edmur Péricles Camargo, conhecido como «Gauchão», militante do PCB, no Aeroporto de Ezeiza, em junho de 1971.

Um diplomata e dois oficiais brasileiros são citados na denúncia. A ação é de novembro de 2021 e as primeiras deliberações judiciais são consideradas positivas. «A causa está andando bem. Talvez seja a última oportunidade de punir essa gente. Todos estão velhos, como eu», afirmou Krischke, ao Estadão.

Justiça italiana reconhece culpa de brasileiros na Operação Condor.

Na sentença da Corte de Assise de Roma, magistrada viu provas ‘unívocas’ do envolvimento dos acusados, antes de declarar a ação extinta em razão da morte dos réus.

Subordinação

Para o ativista, o Brasil sente os efeitos da falta de uma Justiça de transição adequada e da ausência de uma política pública de memória. Esses fatores, disse ele, contribuíram para a ascensão do bolsonarismo e não garantem segurança na subordinação dos militares ao poder civil.

«No Brasil não houve transição. Houve transação. Tancredo Neves era aceitável para os militares em 1961 (quando virou primeiro-ministro com a renúncia de Jânio Quadros). Foi de novo em 1985 (candidato à Presidência na eleição indireta). É uma grande negociação que vem vindo. Sarney aceitou, Collor, FHC e Lula aceitaram.

E o Lula está aceitando de novo. Não entenderam que militar deve estar subordinado ao poder civil», afirmou Krischke. «Os militares no Brasil até hoje só desocuparam a praça, mas continuam manobrando», observou.

A ofensiva do ativista nos arquivos públicos e nos tribunais ao longo das últimas décadas não é apenas uma batalha quase inglória por justiça. As investidas de Krischke contra agentes dos regimes de exceção contam uma história de Estados e governos que agiram com violência contra gerações.