Com Lourdes Mallmann
A Câmara dos Deputados brasileira aprovou no último dia 12 de junho regime de urgência para o Projeto de Lei 1904/24, que equipara o aborto após as 22 semanas, ao crime de homicídio. Nossa organização filiada, a Federação dos Trabalhadores nas Indústrias da Alimentação do Rio Grande do Sul (FTIA RS), publicou imediatamente uma nota de repúdio por considerar essa medida absurda, cruel e inaceitável.
Amalia Antúnez
10 | 7 | 2024
Lourdes Mallmann | Foto: Giorgio Trucchi
Sobre essa nova barbárie apresentada pelos legisladores ultradireitistas e pela chamada bancada da bíblia (neopentecostais), conversamos com Lourdes Mallmann, secretária de Mulheres da FTIA-RS e militante ativa do Comitê Latino-Americano de Mulheres da UITA (Clamu).
“Decidimos nos manifestar com uma nota assim que esse projeto em regime de urgência foi aprovado, porque justamente havia sido negado o aborto a uma menina vítima de estupro”, lembra.
“Essa decisão marca um claro retrocesso em termos de direitos adquiridos, sem falar que é desumana e absurda. A pena prevista no projeto é maior para a vítima do que para o agressor”, destaca Lourdes.
O projeto dispõe que o aborto legal —permitido no Brasil em casos de estupro, risco de morte para a gestante ou um tipo de malformação fetal— só é permitido até as 22 semanas de gestação. Na legislação atual, não há um prazo fixo para a realização do procedimento.
Se o prazo for ultrapassado, a pena será equiparada ao crime de homicídio simples, que estipula de seis a 20 anos de prisão.
Segundo dados oficiais, duas mulheres são estupradas por minuto no Brasil e 80 por cento dos casos envolvem meninas e adolescentes, sendo que os ataques são geralmente cometidos no entorno das vítimas.
Médicos especialistas apontam que muitas vítimas, geralmente meninas de 10 a 12 anos, como não têm um ciclo menstrual regular, não reconhecem os sintomas da gravidez, e as mães dessas meninas, que muitas vezes não denunciam os abusos por medo e culpa, pensam que os enjoos são devido a vermes ou alguma virose.
A gravidez só é descoberta quando a barriga cresce, ou seja, após quatro ou cinco meses de gestação.
Segundo Lourdes, há inúmeros casos em que nos próprios hospitais se nega o direito ao aborto nessas circunstâncias, mesmo quando as meninas estão amparadas pela legislação, ou em que juízes locais tomam medidas para evitar o procedimento.
“Imaginem se esse projeto se tornar lei. É evidente que as mais afetadas serão as meninas e adolescentes pobres, e negras. É uma espiral de violência sem fim”, aponta.
Para a dirigente, além das opiniões pessoais sobre a interrupção voluntária da gravidez, é importante que, como organizações que defendem os direitos humanos, os sindicatos tomem uma posição sobre o tema.
“Acho que, como organizações que lutam pelos direitos das mulheres, temos que fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para que esse projeto não avance.
Especialmente, porque nos casos de estupro, o aborto é um direito constitucional adquirido, não um crime”, concluiu.