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Avança na Câmara o projeto de lei Sônia Maria de Jesus

O Projeto de Lei 3351/2024, conhecido como Lei Sônia Maria de Jesus, está em tramitação na Câmara dos Deputados e avança nas comissões temáticas.

Amalia Antúnez

21 | 8 | 2025


Imagem: Rel UITA

A proposta estabelece diretrizes específicas para atenção e reparação das trabalhadoras domésticas resgatadas de situações análogas à escravidão ou tráfico de pessoas.

O projeto é uma resposta direta ao caso emblemático de Sônia Maria de Jesus, mulher negra, com deficiência auditiva, que vive mais de quatro décadas sob exploração em Santa Catarina.

De autoria da vereadora Carla Ayres (PT-SC), o projeto foi apresentado em outubro de 2024 e já passou pela Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência, com parecer favorável. Atualmente, está em análise na Comissão da Mulher, sob relatoria da deputada Benedita da Silva (PT-RJ).

Depois disso, ainda precisará passar pelas comissões de Trabalho e de Constituição e Justiça.

A proposta prevê um conjunto de políticas públicas para apoiar as vítimas, incluindo acesso à saúde, moradia, educação, reparação financeira, reintegração familiar e acompanhamento psicológico, sempre sob uma perspectiva interseccional que leve em conta gênero, raça, deficiência e classe social.

Além disso, a lei determina a responsabilização dos empregadores, tanto no âmbito penal quanto trabalhista.

Um caso emblemático

O caso de Sônia Maria de Jesus chocou o país em junho de 2023, quando foi resgatada pela força-tarefa do Ministério Público do Trabalho e do Ministério do Trabalho e Emprego na casa do desembargador Jorge Luiz de Borba, em Florianópolis.

Investigações apontaram que ela vivia há mais de 40 anos em situação de submissão total, sem salário, sem acesso à educação e com vínculos afetivos forjados com os patrões — o que, segundo especialistas, é uma das características do trabalho escravo contemporâneo.

Apesar do resgate, em setembro do mesmo ano, Sônia retornou à casa dos investigados após o Supremo Tribunal Federal (STF) negar um habeas corpus preventivo impetrado pela Defensoria Pública da União. O caso gerou forte comoção e críticas da sociedade civil, que apoiou a campanha “Sônia Livre”, lançada pela família biológica de Sônia exigindo a retomada do julgamento do habeas corpus e a garantia de sua liberdade plena.

Em março de 2025, a marcha do 8 de Março em Florianópolis adotou a causa como um de seus motes principais. Diversos movimentos feministas e de direitos humanos, além do próprio Ministério dos Direitos Humanos, passaram a pressionar o Poder Judiciário e o Congresso por respostas institucionais mais contundentes.

Caminhos da reparação

Para os defensores da proposta, a aprovação da “Lei Sônia Maria de Jesus” será um passo fundamental na luta contra à escravidão doméstica e no reconhecimento do sofrimento imposto a milhares de mulheres, majoritariamente negras e pobres, que ainda vivem sob esse tipo de exploração no Brasil.

“A história de Sônia não é um caso isolado. É a ponta de um iceberg estrutural. Por isso, queremos transformar a dor em política pública”, afirmou Carla Ayres durante uma audiência pública realizada em junho deste ano.

Enquanto o projeto avança no Legislativo, o habeas corpus que pode garantir a liberdade definitiva de Sônia ainda aguarda julgamento no STF.

A relatoria está a cargo do ministro André Mendonça, que rejeitou o pedido preliminarmente no ano passado. A Defensoria e entidades da sociedade civil pressionam para que o caso seja incluído na agenda com urgência.