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A vitória do Brasil de Lula em três breves notas

Diferentemente do que indicavam as pesquisas no primeiro turno das eleições no Brasil, em 02 de outubro de 2022, a diferença entre Lula e Bolsonaro foi insuficiente para garantir a vitória do candidato do Partido dos Trabalhadores (PT).

Ricardo Antunes

30 | 01 | 2023


Foto: Ricardo Stuckert

Se Lula venceu amplamente em todo Nordeste, parcialmente em Minas Gerais e alguns estados do Norte, Bolsonaro obteve importantes vitórias em São Paulo, Rio de Janeiro, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, entre outros estados. Foi assim que Lula teve 57.259.504 votos (48,43% dos votos válidos) e Bolsonaro 51.072.345 (43,20%), pouco mais de 6 milhões de votos a favor do candidato operário.

Desde logo se desenhou um cenário imprevisível: poderia Bolsonaro ampliar forças para derrotar Lula? E Lula, como fazer para impedir a ampliação dos votos de Bolsonaro na direita e extrema-direita (com um núcleo fascista em torno de 25 % do eleitorado)? Como impedir que Bolsonaro explorasse ainda mais o sentimento anti-Lula e anti-PT, tão fortes nas clase médias urbanas e nos evangélicos?

A dura vitória no segundo turno, o neofascismo e as tentativas de golpe

Depois de quase um mês de campanha eleitoral, Lula finalmente venceu no segundo turno, com quase dois milhões de votos a mais, graças novamente à enorme votação que obteve no Nordeste, onde Bolsonaro foi repudiado e fragorosamente derrotado. Mas é importante destacar que Bolsonaro ampliou seus votos (quatro milhões a mais que no primeiro turno), consolidando sua base de extrema direita que aglutina fascistas, nazistas, evangélicos conservadores e classes médias urbanas.

Para se sagrar vitorioso, Lula organizou uma frente ampla, da esquerda até a direita, incluindo a neoliberal. O principal ponto de identidade da frenteera claro: luta contra a ditadura, contra o golpe e contra o fascismo.

No sentido eleitoral, tratou-se, então, de uma vitória política de extrema importância, visto que Bolsonaro controlava a máquina governamental e usou todos os recursos para se manter no poder, como nos EUA de Trump: descrédito das eleições para viabilizar um golpe e implantar seu projeto autocrático, neofascista, militarizado e ditatorial. Foi por isso que houve um bloqueio nas principais rodovias do Brasil, objetivando criar um colapso nacional que gerasse um levante de setores das bolsonaristas das Forças Armadas, das Polícias militares e das milicias civis armadas por Bolsonaro.

Quer pela pressão popular, pela ação rigorosa do Supremo Tribunal Eleitoral, o projeto golpista fracassou e em 1 de janeiro de 2023, pela terceira vez, Lula foi empossado Presidente do Brasil. E registre-se aqui, desde que a reeleição foi aprovada no Brasil (1997), Bolsonaro foi o único que não conseguiu ser reeleito.

O mais destrutivo governo de toda a história recente do Brasil, Bolsonaro nos legou um país socialmente destroçado, economicamente em frangalhos e politicamente fraturado. Fome, desemprego, informalidade, destruição ambiental, massacre dos povos e territórios indígenas, racismo, homofobia, feminicídio, sem falar da política negacionista durante a pandemia, que levou a Comissão Parlamentar de Inquérito de acusá-lo de prática genocida. Esta é a “herança” do horripilante (des)governo Bolsonaro.

Os incontáveis desafios do governo de Lula

Como Lula é um político dotado de forte espírito conciliador, seu primeiro desafio será negociar com o Parlamento, buscando uma aproximação com as várias tendencias de direita, com exceção da extrema-direita bolsonarista. Seu primeiro combate será enfrentar no Parlamento a forte oposição que lhe fará a extrema-direita fascista.

Mas Lula encontrará pressão também do centro-direita e da direita que, mesmo não sendo bolsonarista, são seguidoras do ideario neoliberal.

Como as políticas neoliberiais são antissociais, como fará, então, para manter o apoio decisivo da classe trabalhadora, especialmente a mais empobrecida e que lhe garantiu a importante vitória eleitoral? Como irá combater a miséria e o desemprego, sem descontentar e perder o apoio das frações burguesas que o apoiaram?

Por esses e tantos outros desafíos, a nova batalha não será nada fácil.

Um outro desafio central será a questão militar, uma vez que as Forças Armadas estão impregnadas pelo bolsonarismo. Como fará Lula, para impor seu comando e seu controle sobre o Exército?

Mas, independentemente de tantas dificuldades, urge reconhecer que a eleição de Lula foi uma importante vitória contra o fascismo e a ditadura no Brasil, que terá também forte significado na América Latina e em todo o cenário internacional.

Poderá ser, então, o ponto de partida para reinventar um projeto em direção a um novo modo de vida no Brasil?

O que se pode dizer é que essa batalha somente poderá ser conseguida através da intensificação e do avanço da ação dos movimentos sociais, das lutas ambientais, das comunidades originárias, dos movimentos antirracistas, das lutas da classe trabalhadora, dos movimientos feminista, da juventude e das periferias, além dos sindicatos e partidos de esquerda.

Uma nota adicional

Uma semana depois da posse de Lula (e dois anos e dois dias depois do golpe do Capitólio nos Estados Unidos), no dia 8 de janeiro de 2023, o Brasil viu-se atônito, mergulhado em um golpe neofascista, que foi capaz de invadir Palácio do Governo, o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal, em Brasília, destruindo-os completamente.

Contando com a conivência da polícia militar do Distrito Federal e das Forças Armadas, não mais do que três mil fascistas-bolsonaristas mostraram a fragilidade do governo recém empossado. A intentona golpista foi derrotada, mas mostrou que será dura a luta contra os fascistas e nazistas no Brasil. É que somente será vitoriosa se as lutas populares se ampliarem e se intensificarem.