Com base em uma amostragem de 995 trabalhadores da indústria frigorífica, os resultados foram anexados como um capítulo a mais do livro “Trabalhar e adoecer na agroindústria”, que resgata a história da construção da NR36 e também do Programa de Reabilitação Profissional, implementado por iniciativa do Ministério Público do Trabalho (MPT).
Na oportunidade, os autores do livro, entre eles o Dr Roberto Ruiz, médico e assessor da Contac e da Rel-UITA, contaram com o apoio acadêmico de dois professores da Universidade Federal de Santa Catarina, especializados em Saúde Pública e epidemiologia. Também contaram com o fundamental trabalho de Pedro Ruiz no registro e inserção de dados.
A Rel conversou com o Dr Roberto Ruiz sobre esta terceira edição do livro, sobre os avanços e também sobre o que falta fazer com relação à implementação da NR36, norma que regula as condições de trabalho nas empresas de abate e processamento de carne e seus derivados.
-O que está faltando para a NR36 ser mais efetiva?
-De fato, o que está faltando é as empresas e o poder público começarem a fazer a sua parte. No Brasil, os sindicatos têm pouca atuação no interior das empresas.
Os sindicatos não têm autorização legal para entrar nas empresas se quiserem informar a todos os trabalhadores e trabalhadoras.
Entretanto, os promotores do Ministério do Trabalho e do Ministério Público podem entrar em qualquer empresa, a qualquer momento, sem precisarem solicitar autorização prévia das empresas.
-Os resultados da recente pesquisa revelam – entre outras coisas – que os trabalhadores e trabalhadoras da indústria frigorífica ainda sofrem de uma série de doenças musculoesqueléticas. E isso é o que a NR36 pretende combater, não é?
-É. De fato o número de trabalhadores que padecem doenças vinculadas à sua atividade profissional ainda é alto, mas vem diminuindo e isso significa que, desde que a NR36 foi implementada, a situação dos trabalhadores melhorou bastante, porém não completamente.
- Por que isso acontece? As empresas não cumprem os acordos, os trabalhadores desconhecem seus direitos?
- Basicamente, as empresas não cumprem integralmente o estabelecido na NR36.
Como pudemos comprovar em nossa pesquisa, há frigoríficos que ainda não contam com o número suficiente de cadeiras; persistem as falhas no uso seguro da amônia, há empresas que ainda não cumprem com as pausas, sendo que algumas empresas usam a pausa de descanso para o trabalhador ir ao banheiro, o que não é correto.
Por outro lado, a maioria das empresas da indústria frigorífica tem um ritmo de trabalho muito acelerado, o que faz com que os trabalhadores fiquem muito cansados e até, em muitos casos, exaustos.
-Lembrando que esta é uma edição diferenciada, que inclui um capítulo com os Resultados da pesquisa, tendo sido promovida pela Federação de Trabalhadores da Indústria da Alimentação de Minas Gerais, que considera muito importante a divulgação deste estudo.Além disso, esta entidade quer fazer chegar um exemplar do livro aos juízes e procuradores do Ministério Público do Trabalho de Minas Gerais em parceria com o Sindicato dos Trabalhadores da Alimentação de Uberlândia.
-Há alguma medida a ser tomada pelos Sindicatos antes de serem instauradas as fiscalizações do MPT nas empresas frigoríficas?
-Alguns sindicatos estão processando coletivamente as empresas, solicitando insalubridade nos casos onde a empresa não atende aos pontos fundamentais da NR36.
Isto sem dúvida vai melhorar a situação, porque as empresas se verão forçadas a investir na melhoria de suas fábricas, em termos ergonômicos e de segurança.
-Você esteve desde o início do processo de criação, discussão e posterior homologação da NR36. Quais os principais avanços e o que ainda resta por fazer?
-Atualmente, posso dizer que houve um avanço global, pois com a NR36 muitas regras específicas e muito claras devem ser cumpridas pelas empresas.
Antes desta norma, cada empresa fazia o que lhe parecia melhor e quando o trabalhador adoecia, a empresa se desvinculava das suas responsabilidades com relação a essas patologias profissionais.
Ainda há trabalhadores que adoecem, mas o número de doentes e a gravidade das doenças diminuíram.
Em resumo, apesar dos avanços obtidos com a NR36, ainda constatamos que os trabalhadores dos frigoríficos estão expostos a riscos no trabalho que fazem com que adoeçam. Portanto, os sindicatos têm um papel fundamental na capacitação de seus dirigentes e trabalhadores de base para poderem detectar as irregularidades e, a partir daí, tentar negociar com as empresas para corrigi-las. Aquelas que se negarem não terão outra opção a não ser a de serem denunciadas.
Nós da Contac estamos abertos a todos os sindicatos que quiserem apresentar os resultados desta pesquisa ou que quiserem realizar seminários de formação para dirigentes e trabalhadores do setor, sobre a NR36.