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Concentração na indústria frigorífica

Toda a carne à mesa

Produtores jogam suas cartas aguardando a decisão sobre a compra de três frigoríficos da Marfrig pela Minerva. Enquanto isso, os trabalhadores da indústria frigorífica buscam espaços para expressar suas preocupações.

Luciano Costabel

23 | 2 | 2024


Foto: Gerardo Iglesias

Ainda falta tempo para que seja conhecida a resolução da Comissão de Promoção e Defesa da Concorrência (Coprodeco) sobre a compra de três frigoríficos da Marfrig pela Minerva Foods no Uruguai.

O negócio, atualmente em avaliação, faz parte de um acordo mais amplo que envolve a venda de 16 plantas frigoríficas por cerca de 1,5 bilhão de dólares. Onze delas estão localizadas no Brasil, três no Uruguai, uma na Argentina e outra no Chile.

A Coprodeco, responsável por analisar a operação no Uruguai, deverá se manifestar sobre a possibilidade de a empresa controlar metade do mercado das carnes —cenário que se concretizará se o negócio for concluído— resultando em uma posição dominante que impactará produtores, trabalhadores e consumidores.

Após o pronunciamento da comissão, será responsabilidade do Poder Executivo tomar a decisão final sobre o negócio. Em relação a esse assunto, no início deste mês, o presidente Luis Lacalle Pou declarou que, caso o parecer da comissão seja claro, ele o acatará. No entanto, ressaltou que “se houver ambiguidades no parecer, haverá uma margem de discricionariedade por parte do governo”;.

Ainda não se sabe com certeza qual caminho o governo seguirá, mas tudo indica que buscam um ponto intermediário. Enquanto o processo continua, produtores de gado e vendedores de carne têm se manifestado, destacando os impactos negativos em toda a cadeia produtiva.

Efeito dominó

Após o conhecimento da operação no final do ano passado, as agremiações que nucleiam os produtores de gado manifestaram seu enérgico repúdio.

Em uma matéria do semanário Brecha, Patricio Cortabarría, presidente da Associação Rural do Uruguai, afirmou que o acordo “não será benéfico para o mercado”, “pois um único ator terá poder de compra sobre a produção de sete milhões de hectares de pecuária”.

Na mesma matéria, Fernando López, presidente da Comissão Nacional de Fomento Rural, expressou sua preocupação com “o impacto na transparência das transações quando uma empresa detém 45% do abate e 65% da capacidade instalada”.

Desde então, essas agremiações, juntamente com a Federação Rural, têm mantido uma postura proativa ao apresentar os impactos da operação perante a comissão avaliadora. A União de Vendedores de Carne também se uniu a essa luta. Se a operação se concretizar, “ficaremos reféns do mercado”;, afirmou Hebert Falero, presidente da associação, em uma entrevista ao programa Valor Agregado da rádio Carve.

Fora das agremiações, o tema também gera preocupação entre os produtores independentes. Desde meados de dezembro, um grupo de produtores rurais vem coletando assinaturas por meio da plataforma Change.org, com uma petição chamada “A ameaça iminente da Minerva Foods e a necessidade de proteger nosso setor”. A petição já conta com mais de 2.600 assinaturas.

Não iriam ser escutados

Desde o início da avaliação da operação, a Comissão de Promoção e Defesa da Concorrência recebeu as agremiações de produtores, mas não os trabalhadores da indústria, que também serão afetados se a operação for concluída.

No dia 22 de fevereiro, os trabalhadores são recebidos pela primeira vez, após a Secretaria Regional da UITA realizar os contatos que propiciaram a reunião.

Consultado pela Rel, Martín Cardozo, presidente da Federação de Trabalhadores da Indústria da Carne e Afins (FOICA), adiantou que, durante a reunião, os trabalhadores apresentarão a preocupação com a falta de exigências às empresas nesse tipo de transação.

“Não há nenhum parágrafo ou artigo que trate das condições e da proteção dos trabalhadores”, exemplificou o presidente da FOICA. E acrescentou: “Com isso, estamos nos referindo às reestruturações nas equipes, salários e condições de trabalho que ocorrem nesses grandes movimentos”.

Segundo Cardozo, a posição da FOICA é mais de expectativa do que resolutiva, e diante da comissão, eles apresentarão os elementos que mais os preocupam. Principalmente em relação ao mecanismo sistemático de rotação entre as unidades e ao abuso que fazem do subsídio por desemprego.

“Uma ferramenta que nós, trabalhadores, lutamos e conseguimos, agora está sendo usada contra nós, porque se a empresa não atinge seus objetivos nas negociações, nos afunda no seguro-desemprego e utiliza isso como estratégia para acabarmos concordando com o que eles pretendem”, concluiu.