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No Brasil, o fenômeno está em aumento

Trabalho escravo e migração, uma relação íntima

No ranking mundial da escravidão moderna, o Brasil ocupa uma das posições mais altas. O fenômeno possui dimensões de gênero e raça, concentra-se em alguns setores econômicos e atinge níveis particularmente elevados entre os migrantes, tanto brasileiros como estrangeiros.

Daniel Gatti

22 | 2 | 2024


Foto: Gerardo Iglesias

O resgate, na semana passada, no município de Farroupilha, estado do Rio Grande do Sul, de um uruguaio, trouxe à tona novamente a situação dos estrangeiros que são vítimas de condições de trabalho análogas à escravidão.

Natural do departamento fronteiriço de Rivera, o uruguaio trabalhava na colheita de maçãs e foi resgatado juntamente com quatro brasileiros, entre eles dois menores de idade.

Todos tinham sido contratados sob falsas promessas de remuneração e moradia, sendo confinados em uma pocilga, com "péssimas condições de saúde, segurança e higiene", numa área com esgoto a céu aberto, de acordo com a Polícia Federal.

O proprietário do estabelecimento, detido em flagrante, só fornecia aos resgatados alguns alimentos e nenhum artigo de limpeza e higiene. Não tinham dias livres, se chovesse não eram remunerados, e só recebiam o salário prometido se trabalhassem 16 horas por dia.

O empresário será obrigado a indenizar os trabalhadores, que, por sua vez, serão transferidos para as suas cidades de origem.

A correlação entre trabalho escravo e fluxos migratórios é observada em todos os países. O Brasil não é exceção, e o número de estrangeiros vítimas desta situação só tem aumentado nos últimos anos.

De acordo com dados oficiais, em 2022, os bolivianos representaram 42% dos estrangeiros submetidos a trabalho escravo resgatados pela Polícia Federal, seguidos pelos haitianos (24%), venezuelanos (12%), paraguaios (10%) e peruanos (7%). Logo após estão os chineses, argentinos e uruguaios.

Mais de um milhão de escravizados no Brasil

Em escala global, a agricultura é o setor onde se registra o maior número de casos de trabalho análogo à escravidão. No Brasil, as vítimas frequentemente são homens jovens e negros escravizados no exercício dessa atividade econômica.

Na mineração e na construção, as vítimas de escravidão ou semiescravidão também são, em sua maioria, homens; já no trabalho doméstico e na indústria têxtil, as vítimas são mulheres.

Em 2023, o Brasil ocupou a 11ª posição no ranking mundial de trabalho análogo à escravidão estabelecido pela Walk Free, que abrange 160 países.

A ONG, sediada na Austrália, estimou que no Brasil, a nação mais poderosa da América do Sul e a oitava maior economia do mundo, mais de um milhão de pessoas são escravizadas.

O Brasil ocupou também a 9ª posição nas Américas em esforços realizados pelo governo para combater o fenômeno, uma posição relativamente baixa devido ao fato de que, assim como os Estados Unidos, o país legalizou o trabalho em condições análogas à escravidão em seu sistema penitenciário.

Se considerarmos os últimos 14 anos, o Ministério do Emprego e Trabalho informou que 2023 foi um ano recorde em termos de resgates de trabalhadores nessa situação (3.190, em comparação com 2.587 em 2022) e em indenizações recebidas pelas vítimas.

83% das pessoas resgatadas se autodeclararam negras ou pardas, 15% brancas e 2% indígenas. A maioria era composta por homens.