Brasil | AMBIENTE | AGROTÓXICOS
Com Leomar Daroncho
Avança perigosamente o PL do Veneno
Brasil abre a porteira
para os agrotóxicos
O Projeto de Lei 6.299/2002, conhecido como PL do Veneno, que flexibiliza o uso e a comercialização de agrotóxicos, foi aprovado em sessão de urgência da Câmara dos Deputados em fevereiro deste ano.
Amalia Antúnez
17 | 06 | 2022
Imagem : Allan McDonald Rel UITA
Nas mãos do Senado, cujo presidente Rodrigo Pacheco havia prometido em ato público analisá-lo exaustivamente, o projeto parece que vai é descer goela abaixo.
A crescente possibilidade de que seja aprovado, fez soar mais uma vez os alarmes da comunidade científico-academica, sem falar dos trabalhadores que veem nesta lei um grande retrocesso.
Sobre isso conversamos com o procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT), Leomar Daroncho, integrante do Fórum Nacional de Combate ao Impacto do Uso de Agrotóxicos.
“Esse projeto chegou oficialmente ao Senado no dia 1º de junho, onde começou a tramitar com um novo número (PL 1459/2022) e ao contrário do que Pacheco prometeu, só será analisado pela Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA), fortemente ligada aos setores do agronegócio”, explicou Daroncho.
Para o procurador do MPT e especialista no assunto, a pressão das corporações que vendem esses insumos para o agronegócio é a chave para que esse projeto de lei não seja analisado com o rigor que deveria.
“É preciso ressaltar enfaticamente que esta proposta defende os interesses apenas da indústria química, não dos agricultores. De fato, a grande maioria dos produtores agrícolas tem dificuldades de acesso a esses insumos porque seu custo já é altíssimo, o que também vem gerando o crescimento do contrabando de substâncias agroquímicas. E isto é muito perigoso”, enfatizou.
Para Daroncho, o projeto não só agrava o uso abusivo de agrotóxicos, com as consequências que isso traz para a saúde de trabalhadores, produtores e consumidores, como também coloca o Brasil em desvantagem na hora de comercializar os seus produtos agrícolas.
“A forma como este projeto foi apresentado, buscando abrir a porteira para o uso e comercialização de substâncias proibidas em seus países de origem, também deixa a produção agrícola em uma péssima situação, pois certamente encontrará barreiras nos principais mercados mundiais, como a Europa e os Estados Unidos, onde muitas normas são exigidas nesse sentido”, disse.
O problema é enorme porque na prática não é fácil parar com o uso indiscriminado de agrotóxicos.
“Existem inúmeros casos de plantações contaminadas por agrotóxicos, devido ao fenômeno da Deriva*. Eles permanecem no ar, na água e no solo por muito tempo depois de sua pulverização. Devido a isso, danificam os cultivos orgânicos, matam as abelhas onde elas estiverem, e por fim adoecem as pessoas, "lamentou Daroncho.
De tempos em tempos, novas pesquisas relacionam o uso de agrotóxicos com doenças como câncer, esterilidade e malformação fetal, além de depressão e suicídio.
O Fórum trabalha em conjunto com organizações que investigam cientificamente a correlação entre o uso de agroquímicos e algumas doenças”, destaca.
Segundo o especialista, a maioria das consequências do consumo ou exposição a esses venenos não se manifesta de imediato. Ocorre na forma de doenças crônicas ao longo do tempo, o que dificulta a análise de dados estatísticos sobre o assunto.
“No que diz respeito às fiscalizações no setor rural, principalmente as de resgate do trabalho escravo, uma série de irregularidades também pode ser observada em relação ao uso de agrotóxicos”, disse o procurador.
Constatou-se “falta de equipamentos de proteção adequados e até irregularidades no armazenamento, somadas ao uso de produtos clandestinos que entram no país como contrabando, agravando a situação dos trabalhadores e das trabalhadoras”.
Entre as mudanças absurdas propostas pelo projeto está a nomenclatura usada para estes venenos: em vez de chamá-los de agrotóxicos, eles propõem denominá-los de produtos fitossanitários.
"Essa mudança de nomenclatura é como colocar uma plaquinha de sal no açucareiro e esperar que as formigas não percebam a diferença", ironizou Daroncho.
O procurador também alertou que se a legislação atual, uma legislação bastante razoável, for modificada, “as consequências potenciais serão catastróficas”.
Nota do Tradutor: O fenômeno da deriva surge quando da aplicação de agrotóxicos, o composto químico deixa de atingir somente o local de sua aplicação, passando a atingir propriedades lindeiras através da evaporação e, principalmente, através do deslocamento do produto por meio do vento.