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Segurança digital e violência no campo
Com Daivi Lopes Kuhn

Muito além do Big Brother e da Big Data

Muito além do Big Brother e da Big Data Especialista na área de segurança digital, Deivi Lopes Kuhn participou do Seminário Direitos Humanos e Segurança na Ação Sindical organizado pela nossa filiada Contag, nos dias 5 e 6 de março em Brasília.

Convidado pela CUT, Lopes Kuhn ministrou uma palestra informativa sobre segurança digital e defendeu o uso do software livre como recurso de segurança para os usuários comuns de dispositivos eletrônicos, como computadores, tablets, celulares e televisores inteligentes (Smart TVs), ao associar o uso de tecnologias da informação com a possibilidade de estarem sendo permanentemente vigiados.

-O que exatamente você faz e como você chegou a esse seminário?
-Sou especialista na área de privacidade e segurança digital. Há muito tempo trabalho com tecnologias de software livre e me tornei ativista nesse sentido, buscando transformar a forma como nos relacionamos com as tecnologias da informação (TIC).

Acredito que os usuários devem ser atores centrais e capazes de conhecer e alterar as tecnologias.
Isso levou a uma disputa mundial sobre as formas de uso das TIC. Há muito tempo existe um movimento bastante organizado que defende o uso do software livre, para o acesso dos cidadãos a essas tecnologias.

A disputa, então, resume-se à dicotomia entre fechar ou abrir o conhecimento sobre este assunto.

Meu trabalho atual consiste em questões de privacidade e segurança para a população no nível digital, detectando spyware, entre outras coisas.

-Há alguma legislação para controlar esses tipos de ataques digitais ou ainda há um grande vácuo legal quando falamos sobre roubo de dados privados através das diferentes plataformas digitais?
-No Brasil houve uma tentativa bastante inovadora nesse aspecto, mas como em várias questões de direitos fomos ficando para trás, havendo uma grande preocupação nesse sentido.

Atualmente, a lei sobre a proteção de dados pessoais está para ser publicada, devendo entrar em vigor em agosto. Com isso, teríamos um pouco mais de garantias, como por exemplo, pedir que nossos dados sejam excluídos de determinados lugares ou proibir que sejam espionados.

Mas é um pequeno avanço em termos de garantias pessoais que ainda deve ser confirmado na prática.

O poder das corporações

-Em sua dissertação você nos mostrou como, através de nossos celulares ou de nossos computadores ou mesmo de nossas Smart TVs, estamos expostos e vigiados, como em um gigantesco Big Brother…
– Estamos em um Big Brother gigante, totalmente vigiados. Se formos ao Google Maps Time Line, podemos ver registrado onde estivemos.

Acho que supera o paralelo com o Big Brother, que sempre esteve associado à ideia de controle estatal. Agora, também somos controlados por corporações, Google, Facebook e todas as que querem acessar as informações que fornecemos a essas empresas.

-Trata-se então de vigiar e controlar?
-Sim, quem tiver acesso ao Big Data com as informações que fornecemos, poderá gerar perfis que serão então usados para fins políticos e/ou comerciais.

Já não aconteceu de você estar procurando ou falando em sua casa sobre trocar a geladeira e depois de um tempo você entra na sua timeline do Facebook e aparecem vários anúncios com várias ofertas das geladeiras mais recentes?

E este é um exemplo de algo quase inofensivo que já pode ser feito, mas também houve casos de manipulação para fins políticos: eles traçam o seu perfil e bombardeiam você com propaganda de coisas que o político “x” fará se você votar nele, ou enviam notícias falsas, as tais fakenews, sobre os adversários.

-Como essa vigilância está ligada ao aumento da violência no campo?
-Aqueles que acessam as informações geralmente são aqueles que têm dinheiro e poder. Portanto, grandes capitais podem facilmente obter muitos dados, sem mencionar a possibilidade de dispor de drones para vigiar regiões e pessoas.

Um grande bumerangue

Nosso comportamento diante das TIC pode permitir que essas grandes empresas lidem com nossos dados e isso nos torna completamente vulneráveis, porque qualquer pessoa pode ter acesso ao meu perfil, ao meu endereço, ao meu telefone, à minha família.

Chegamos a um estágio em que não nos importamos com a nossa privacidade e esse comportamento da humanidade é preocupante porque estamos fornecendo dados que podem e serão usados contra nós.

Isso no dia-a-dia do campo traz grandes e reais perigos e aqueles que tiverem dinheiro serão os que poderão dominar as tecnologias. Dessa forma, as desigualdades sociais continuarão aumentando, e promovendo a violência.

-Como nos preparamos para enfrentar esse cenário?
-Com conhecimento. Entender as regras do jogo, sendo conscientes de que a tecnologia não é neutra, que é de fato um território central de disputa onde o grande capital está metido. Das 10 maiores empresas do mundo, seis são de tecnologia.

Seu poder é enorme, porque controlam toda a cadeia produtiva, e com ela controlam a Big Data e as nossas vidas.
Temos que abrir esse debate, usar a tecnologia a nosso favor. É por isso que esses espaços de ativismo são tão importantes.


Em Brasília, Amalia Antúnez