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Back ddhh O Brasil vive regime de exceção quando se trata de direitos indígenas
Luciana Gaffrée
Em Montevidéu, Luciana Gaffrée
Brasil
POVOS INDÍGENAS
O Brasil vive regime de exceção quando se trata de direitos indígenas
Para suspender os direitos indígenas, o governo recorre a um tipo de suspensão surgido na lei processual brasileira de 1964, durante o regime de exceção. De acordo com o MPF/PA, não só usam uma “lei de exceção” em pleno estado de direito, como desrespeitam a Convenção 169 da OIT e o Principio da Precaução
No dia 4 de junho de 2013, os indígenas, que ocuparam por nove dias a usina Belo Monte, escreveram uma carta onde afirmam que, no mesmo dia em que foram retirados à força pela polícia, havia sido morto um parente Terena no Mato Grosso do Sul[1]. “Então, nós decidimos que não queríamos outro morto. Nós evitamos uma tragédia, vocês não. Vocês não evitam tragédias, vocês executam”, afirmam em sua Carta número 9: tragédias e barragens.
 
Para os povos indígenas, as barragens matam a terra indígena, matam a cultura, matam o peixe e afogam a terra. “E isso mata a gente sem precisar de arma”, diz a carta.
 
A histórica usurpação dos direitos indígenas, emblematicamente representada no Relatório Figueiredo, é retomada com toda a força agora, com o projeto de construção de pelo menos 11 hidrelétricas, em estágios variados de construção e licenciamento.
 
O Ministério Público Federal, nos três processos que moveu exigindo a Consulta prévia aos indígenas, obteve vitórias em favor dos indígenas. Mas, como então o governo consegue suspender as decisões favoráveis aos índios e continuar as obras?
 
Porque, como informam os desembargadores da 5ª Turma do TRF1, que julgou os casos de Belo Monte e Teles Pires, o governo recorre a um tipo de suspensão surgido na lei processual brasileira em 1964, durante o regime de exceção. Usam de liminares e suspensões de segurança, sem julgamento em plenário, ou seja, usam uma “lei de exceção” em pleno estado de direito. “Portanto, a lei que criou a figura excepcional de suspensão de segurança, rompendo com o devido processo legal, é um diploma autoritário”, afirmam os desembargadores.
 
Desrespeitando a Convenção 169, as resoluções do Conselho Nacional de Política Energética e da Agência Nacional de Energia Elétrica, que definem como a obra será realizada, são tomadas sem a participação dos povos afetados. A Convenção 169, entre outras coisas, estabelece que os povos indígenas e os que são regidos, total ou parcialmente, por seus próprios costumes e tradições ou por legislação especial, devem ser consultados sempre que medidas legislativas ou administrativas afetarem seus interesses.
 
A Declaração do Rio, na Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, realizada em 1992, assim dispôs sobre oprincípio da precaução: Princípio 15- De modo a proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades.
 
Quando houver ameaça de danos sérios ou irreversíveis, a ausência de absoluta certeza científica não deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental.
 
O Processo sobre a consulta
da usina Teles Pires
 
De acordo com o MPF/PA, o processo de licenciamento da usina é irregular, sem ter havido jamais uma consulta prévia aos povos indígenas e ribeirinhos afetados.
 
A usina Teles Pires, já em estágio de construção, explodiu cachoeiras consideradas território sagrado para os índios Munduruku. O Tribunal Regional Federal da 1° Região, em Brasília, ordenou a paralisação da obra em agosto passado, mas a decisão dos três desembargadores que analisaram o processo foi suspensa por uma decisão monocrática do presidente do Tribunal, o desembargador Mário César Ribeiro.
 
O Processo sobre a consulta da
usina São Luiz do Tapajós
 
No Processo da São Luís do Tapajós, também foram suspensas as decisões favoráveis aos índios, por meio de uma decisão monocrática do presidente do Superior Tribunal de Justiça, Félix Fischer. O MPF também informa que em todas as instâncias judiciais foi reconhecido o direito à consulta dos índios, porém o governo não só nunca fez consultas como, além de recorrer na Justiça, baixou um decreto para garantir à força a entrada de tropas especiais e assim garantir os estudos de impacto dentro das terras indígenas.
 
Caso as obras continuem, corre-se o risco de os danos ambientais e às comunidades indígenas serem irreversíveis, alerta o MPF/PA. “Dessa forma, os territórios, a vida das comunidades, o conhecimento tradicional e o patrimônio genético e cultural associado, bem como o meio ambiente, estão gravemente ameaçados pelas irregularidades da obra”, diz o documento processual.
 
Na Terra Indígena Praia do Mangue, Itaituba, representantes indígenas relataram que o anúncio da chegada dos projetos hidrelétricos já está provocando a invasão de garimpeiros ilegais, madeireiros e grileiros em terras indígenas, em busca principalmente de ouro e diamante em áreas de unidades de conservação e terras indígenas, contaminando seus rios e interferindo na pesca praticada pelos indígenas
 
Processo sobre a consulta da
usina Belo Monte
 
No caso do processo sobre a consulta da usina Belo Monte, atingindo o povo Xingu e iniciado em 2006, a decisão favorável aos indígenas, que paralisou a usina por dez dias em agosto de 2012, também foi suspensa por uma decisão monocrática, do então presidente do Supremo Tribunal Federal, Carlos Ayres Britto. 
 
O governo federal alegou que os indígenas do Xingu nem precisariam ser consultados, porque a hidrelétrica não alagará terras indígenas. A questão é que a obrigação prevista na Convenção 169 é a de consultar os povos afetados e que terão seus modos de vida modificados.  E, no caso do povo Xingu, o rio será desviado e, portanto, as terras indígenas irão secar. Impacto de enorme gravidade.
 
As usinas hidrelétricas não são imprescindíveis para o Brasil, afirma o MPF/PA. “Não haverá qualquer apagão se ela não for construída – ou atrasar sua construção pela necessidade de consulta aos povos indígenas afetados. Entre 2009 e 2011, o Brasil contratou mais de 8 mil MW em energia eólica em leilões.
 
A capacidade atual da indústria supera os 2 mil MW de construção de parques por ano – ou seja, em menos de 4 anos é possível ter a capacidade instalada em todas as usinas do Tapajós com parques eólicos a um custo inferior de 40 bilhões de reais (3,5 a 4 mil por kW), possivelmente inferior aos custos reais das usinas, sem seus impactos socioambientais”, afirma o MPF/PA.
 
Para os povos indígenas Munduruku, Xipaya, Kayapó, Arara, Kayapó, Terena, Guajajara, Apinajé, Xerente, Krahô, Tapuia, Karajá-Xambioá, Krahô-Kanela, Avá-Canoero, Javaé, Kanela do Tocantins, Guarani e Tupinambá o que falta é o governo parar de dizer mentiras em notas e entrevistas.
 
Basta de os índios serem tratados como crianças, ingênuas, tuteladas, irresponsáveis e manipuladas. “Temos o apoio de toda a sociedade nacional e internacional e isso também incomoda bastante a vocês, que estão sozinhos com seus financiadores de campanha e empresas interessadas em crateras e dinheiro”, afirmam os índios na Carta n°. 7: governo federal, nós voltamos.

 

indigenas 20130612-610

Fotos: Ruy Sposati (Gentileza do Conselho Indigenista Missionário)

 

Rel-UITA
12 de junho de 2013

*Com informações do Ministério Público Federal e do Movimento Xingu Vivo Para Sempre

[1] O indígena Terena, Oziel Gabriel, 35, morreu baleado em confronto com policiais federais e militares na tentativa de cumprimento da reintegração de posse da fazenda Buriti. Nessa mesma região, o indígena Josiel Gabriel Alves, 34 anos, também baleado, corre sério risco de ficar tetraplégico.