Seminario Internacional sobre Violencia en el Campo

Violência no Meio Rural: A favor da vida e da paz

Carta Aberta
Violência no Meio Rural:
A favor da vida e da paz
 

 

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CARTA ABERTA

Violência no Meio Rural: A favor da vida e da paz

Nós do Movimento Sindical, cidadãos da América Latina, produtores familiares, trabalhadores assalariados (as), indígenas, acadêmicos, pesquisadores e instituições que atuam na área rural, vimos a público trazer um breve relato da violência no meio rural em suas diversas vertentes e de suas consequências diretamente vinculadas à concentração da terra e do poder, à mecanização e à precarização das relações de trabalho, bem como da ausência e imparcialidade do Estado. Vimos expressar nossa solidariedade, nossa indignação e, ao mesmo tempo, exigir providências imediatas da Justiça.
 
Vários dos casos expostos durante o Seminário Internacional sobre Violência no Campo: Cenários, Vítimas e Agressores[1], e também aqueles objetos de pesquisas e denúncias, da violência direta e indireta, infelizmente têm se tornado uma prática comum em todo o continente.
 
Os grandes proprietários, o agronegócio e as transnacionais atuam como uma verdadeira rede do crime organizado transnacional, uma vez que essa violência é funcional em sua ofensiva pela privatização da natureza, pela concentração de terras e pela produção em larga escala.
 
A concentração fundiária no Brasil é uma das maiores do mundo. Menos de 50 mil proprietários rurais possuem áreas superiores a mil hectares e controlam 50% das terras cadastradas. Cerca de 1% dos proprietários detém 46% de todas as terras. Segundo dados do INCRA[2], existem cerca de 100 milhões de hectares de terras ociosas no Brasil.
 
Ao mesmo tempo, mais de quatro milhões e meio de famílias de trabalhadores e trabalhadoras rurais não possuem terra e vivem num estado de pobreza extrema.
 
A concentração de terra está diretamente relacionada como a concentração do poder. Os poucos donos das terras, que sempre receberam privilégios e exerceram influência sobre as instâncias governamentais em nome de seus interesses pessoais, financeiros e políticos, exploram, escravizam, ameaçam, torturam e matam aqueles e aquelas que ousam lutar contra seus privilégios.
 
Na América Latina, milhares de assalariados e assalariadas rurais têm seus direitos violados, em relações de trabalho informais que muitas vezes os tornam escravos do latifúndio. Apenas no Brasil foram libertados, de 1995 a 2012, 44.230 trabalhadores e trabalhadoras rurais, estimando-se que outros 25 mil encontram-se hoje nesta situação.
 
Além disso, em muitos países, especialmente na Colômbia e na Guatemala, existem restrições ao direito de liberdade sindical. Muitas tentativas de organização foram e são violentamente reprimidas e centenas de líderes e ativistas foram assassinados.
 
Dentre as várias soluções, o Trabalho Decente, a Reforma Agrária justa e a distribuição de renda representam um importante instrumento para amenizar esses problemas. O que falta para isso ser solucionado é vontade política e um olhar mais humano em relação aos pobres que vivem em situações e regiões de risco, onde o que impera é a lei de quem tem mais. A omissão do governo, que procura responder pelos interesses dos poderosos, dos grandes latifundiários, é notória: só vale quem tem poder aquisitivo!
 
Esta ferocidade atroz do capitalismo, em seu formato neoliberal, está desencadeando uma violência aos direitos territoriais, onde os direitos humanos e coletivos não existem neste mundo, com a cumplicidade dos Estados.
 
As terras para cultivo e os bens naturais, como a água, são a última fronteira de dominação, e não importa se, no caminho, centenas de povos estão sendo exterminados. E não é mais apenas uma ameaça, é uma guerra silenciosa e de baixa intensidade, venda de carbono, transgênicos, represas, hidrelétricas, militarização, concentração de terras, água, mangues e mares.
 
O aumento da violência no meio rural não se limita aos conflitos de disputa pela terra, atualmente há assassinatos sistemáticos daqueles que dedicam suas vidas à defesa e proteção da natureza e por uma utilização racional dos recursos naturais. O avanço do agronegócio potencializa o aumento dos crimes ambientais, em claro desrespeito à legislação vigente, comprometendo a preservação e a conservação da biodiversidade.
 
O cenário histórico da estrutura fundiária do país é, sem dúvida, o responsável pelo desequilíbrio no meio rural, a formação histórica voltada para a exploração, onde se criou o latifúndio, o plantio voltado para a monocultura e a economia de exportação. Forma-se então uma categoria de trabalhadores rurais sem terra para plantar e sem trabalho digno para viver. Somam–se a esses fatos, a mecanização, a erradicação de lavouras, a ausência de crédito agrícola e assessoria técnica, a pressão do latifúndio, a dificuldade de provar a posse via regularização fundiária, e a falta de infraestrutura educacional, sanitária e de lazer que, ao fim, provocam a migração rural inchando as cidades e formando os cinturões de miséria.
 
A violência do latifúndio está constituída por uma violência estrutural que marginaliza, obriga os assalariados e assalariadas do campo a empregos indignos, mata milhões de crianças de desnutrição, trabalho escravo, exigindo um verdadeiro sacrifício humano. Ficam, portanto, claras as estratégias que este latifúndio utiliza: eliminam lideranças, criam medo e pânico para acabar com as organizações dos trabalhadores por reivindicações, denunciam trabalhadores por práticas não cometidas por eles, e contratam milícias fortemente armadas para eliminar os trabalhadores e trabalhadoras rurais. 
 
Em nossa América, não há um espaço onde não existam conflitos sociais devido à terra, aos rios, aos mares, às costas, ao subsolo, ou seja, aos bens comuns das comunidades camponesas, territórios indígenas, quilombolas e pescadores artesanais.
 
Já não há mais país nem região onde não haja assassinatos ou expulsão de indígenas e camponeses de suas terras. No Brasil, para construir represas e hidrelétricas dezenas de povos são afetados como os Guaraní-Kaiowá, entre outros.
 
No Paraguai, tivemos o assassinato de 11 camponeses durante as desapropriações em Curuguaty.
 
Em Honduras, mais de 55 camponeses assassinados no Baixo Aguán.
 
Na Colômbia, onde são assassinados 6 de cada 10 dirigentes sindicais no mundo, mataram Juan Carlos Pérez Muñoz, trabalhador cortador de cana e dirigente do SINTRAINAGRO.
 
No Brasil, o recente assassinato de Cícero Gudes dos Santos do MST.
As negligenciadas lutas indígenas no Equador, Peru e Chile, onde os Mapuches são considerados pelas leis como terroristas e, portanto, presos por defenderem seu território[3].
 
Exigimos que as autoridades competentes e organizações internacionais de defesa dos direitos humanos tomem as medidas pertinentes para garantir a segurança dos trabalhadores e trabalhadoras e de suas famílias, bem como para que implementem a legislação vigente e mecanismos punitivos mais eficientes, garantindo que os autores e mentores sejam julgados e condenados, dando um basta à impunidade.
 
Exigimos, ainda de todos os governantes, o avanço nas investigações dos casos dos assassinatos e das expulsões irregulares e injustas, praticados no meio rural.
 
Convocamos as organizações de trabalhadores e trabalhadoras, e a sociedade civil da América Latina, em geral, e do Brasil, em particular, para participarem e colaborarem da CAMPANHA INTERNACIONAL CONTRA A VIOLÊNCIA NO CAMPO.

  

 

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