Há fatos que valem por rios de tinta,
milhares de imagens ou infinidade de bytes
milhares de imagens ou infinidade de bytes
Pará, terra sangrenta
Quando os assassinos dançam sobre as sepulturas
“Fazemos o que queremos, quando queremos”
Há fatos que valem por rios de tinta, milhares de imagens ou infinidade de bytes. Revelam a verdadeira cara de uma pessoa ou grupo social. No Norte, no estado do Pará, há apenas duas semanas, a autoridade local do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) concedeu terra aos mandantes do assassinato, em maio de 2011, de José Cláudio Ribeiro e Maria do Espírito Santo, um casal de extrativistas e lutadores pela terra e pela ecologia.
José Rodrigues Moreira, principal acusado de ser o mandante da morte dos dois assentados e também pilares da resistência contra o avanço das empresas madeireiras na floresta amazônica, estava inscrito no INCRA como aspirante a colono, assim como sua esposa, Antônia Nery de Souza. Uma parceria de fato.
No dia 14 de dezembro de 2012, o superintendente local do INCRA, Edson Luís Bonetti, assinou uma resolução concedendo a Antônia Nery o mesmo lote pelo qual o seu esposo mandou matar o casal José Cláudio e Maria.
Não se trata de um “erro por inadvertência” ou de uma “omissão fortuita”, mas de uma cruel confirmação: consórcios de empresários madeireiros e latifundiários continuam dispondo da vida, da natureza e até mesmo da memória das pessoas em “territórios ausentes de lei federal”.
Não só pretendem ser a lei e a ordem contra quem lhes opuser resistência, como também permanecem impunes e enchem de terror qualquer um que queira resistir mas ainda não se atreveu.
Consultado pela A Rel, Francisco de Assis da Costa, secretário da Organização da Federação de Trabalhadores na Agricultura (FETAGRI) do Pará, explicou que “Não se trata de um fato isolado nem novo. Este é mais um exemplo de uma política sistemática de proteção e, neste caso, de premiação ao mandante do assassinato dos camponeses indefesos.
É um prêmio e uma mensagem para toda a sociedade do sudeste do Pará. Essa mensagem diz: ‘Fazemos o que queremos, quando queremos’”.
Segundo Da Costa, a FETAGRI já havia advertido às autoridades locais e federais do INCRA, há algum tempo, através de notas oficiais, assim como ao Ministério Público, de que esta senhora, esposa do mandante dos assassinatos, ainda permanecia na lista de aspirantes a colonos.
“Por isto fomos tomados de surpresa. Pensávamos que o elevado grau de exposição do caso faria recuar os assentamentos. Mas nos equivocamos. A realidade superou a mais absurda ficção”, disse Da Costa.
A reação da FETAGRI, da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e de numerosas organizações sociais não se fez esperar e a informação adquiriu rapidamente repercussão nacional.
Há apenas alguns dias, três meses depois da concessão do lote, o INCRA decidiu investigar o assunto, exonerando Edson Luis Bonetti, superintendente do organismo na região.
Francisco da Costa, por outro lado, acredita que “Não basta destituir um funcionário corrupto. Trata-se de uma política deliberada para favorecer os consórcios de madeireiros e latifundiários. Enquanto não mexerem profundamente nesta política e não instrumentalizarem uma reforma agrária integral, estas coisas continuarão acontecendo.
Nós continuaremos denunciando e lutando –acrescentou. Por exemplo, agora advertimos que no lote concedido ao mandante dos assassinatos havia várias famílias morando lá há anos. A Polícia apareceu e deu ordens para abandonarem rapidamente suas terras, quando se sabe que a concessão não é legítima”.
Da Costa também assinalou que os camponeses acampados em diversos terrenos da região, e que reivindicam terra para viver e produzir, são alvo permanente de ameaças, insultos e provocações feitas por civis e policiais.
A última ironia deste episódio é que agora o Ministério Público deve buscar a via legal adequada para anular a concessão, que foi feita em termos regulamentares. Desde já, a promotoria adverte que “não será simples”.
