-Como era o trabalho no frigorífico na época em que você chegou aqui?
-Em 1983 eram abatidos 14 mil frangos por dia, não se exigia ritmo de produção, não conhecíamos ninguém com lesões ou doentes por causa deste trabalho…
A partir de 1994, começou-se a exigir uma velocidade mínima na esteira, quantidades de coxas desossadas, de peitos, asas e todo o resto. Foram estabelecidos ritmos e produtividades mínimas.
Já em 1999 e 2000, os trabalhadores começaram a se queixar de dores, e em 2012 começamos a saber o que são as Lesões por Esforços Repetitivos (LER). Nosso sindicato, que abrange 27 municípios na região, integrou o assunto à sua agenda.
-Quantos frangos são abatidos agora?
-Antes da aprovação da NR36 chegaram a ser abatidos 184 mil frangos por dia.
Mais pausas e menos ritmo de trabalho
-Estão aplicando a NR36?
-Fomos pioneiros na adoção do sistema de pausas; inclusive, antes que fosse aprovada formalmente a Norma Regulamentadora, já tínhamos conseguido que fossem realizadas cinco pausas de 10 minutos durante cada turno, ou seja, 5 minutos a mais por turno do que a NR exige hoje. Isto se mantém até agora.
-Quantas coxas eram desossadas por minuto antes e quantas são agora?
-Não temos estudos precisos sobre anos anteriores, mas isso dependia bastante de cada trabalhador.
Temos antecedentes de pessoas que chegaram a desossar até 11 coxas por minuto, que é o caso de nossa companheira Valdirene, na qual as LER foram tão graves que ela chegou a perder o braço direito.
Atualmente, estamos com uma média de 5 coxas por minuto, mas já praticamente definimos com a empresa que até antes do final do ano o ritmo máximo exigível será de 4 a 4,3 coxas/minuto.
Minha opinião é que um trabalhador não deveria desossar mais de 3,5 coxas por minuto, não só pelo ritmo de trabalho, mas também pelo ambiente de trabalho: trabalha-se com uma faca em uma matéria muito gordurosa e com luvas, o que protege, mas também diminui a precisão e às vezes obriga a aplicar muita força com os dedos.
E dentro também
-Como controlam que os ritmos sejam os pactuados?
-Não controlamos apenas os ritmos, mas também outros aspectos do ambiente de trabalho como, por exemplo, a temperatura.
Temos permanentemente dentro da fábrica pessoas designadas pelo sindicato para medir a velocidade do trabalho e a temperatura.
Essa presença garante que a tarefa seja cumprida de acordo com o definido. Pelo menos isto ocorre nesta fábrica de Forquilinhas. Aqui se chegava a sete coxas por minuto, e se reduziu a cinco; na esteira eram pendurados 171 frangos/minuto, e agora estamos em 166, graças à ação do sindicato.
Em nossa experiência, a chave para a implementação destas mudanças e da própria NR é a ação forte e decidida dos dirigentes de base com o apoio do sindicato, é o único que consegue prevenir as doenças no frigorífico.
Pausa, fôlego e o olhar além da branca monotonia
-Ou seja, além do ritmo de trabalho está também a questão do frio…
-O ambiente de trabalho nestes frigoríficos não é para todos os seres humanos, porque se trabalha com velocidade, umidade, e gordura, enclausurado em um ambiente controlado tanto na temperatura como na qualidade de ar e de luz.
Estar nesse ambiente por mais de 7 horas por dia é muito exigente porque as condições são muito duras. Por isso, é muito importante a NR, e nós lutamos para que o tempo de pausa seja também um tempo de qualidade, isto é, que os trabalhadores saiam para tomar ar fresco.
Em diversos seminários vários médicos nos disseram que é necessário respirar oxigênio natural para que o cérebro possa trabalhar normalmente. Portanto, alguém que permanece tantas horas dentro de um ambiente artificial pode ter outros prejuízos que poderiam desencadear doenças físicas ou psicológicas.
-Isto foi detectado nos trabalhadores?
-Percebemos que já há uma incidência crescente de doenças mentais, sem dúvida.
-Há outras condições de trabalho prejudiciais?
-Tem o ruído metálico das esteiras que é muito forte, o ambiente monocromático onde quase tudo é branco, e isto é questão de debate, mas eu acho que o som – música – ambiente que a empresa coloca é também prejudicial porque as pessoas não se comunicam entre si, só estão lá, em pé ou sentadas, realizando suas tarefas de maneira completamente isolada.
As condições de trabalho nos frigoríficos precisam melhorar ainda mais, e não apenas por ação dos sindicatos, mas também pela atividade fiscalizadora do Estado, porque temos uma demanda muito grande de trabalhadores que devem ser amparados pela Previdência Social, o que representa um custo para todos os brasileiros gerado pela empresa privada.
En Montevideo, Amalia Antúnez
Fotos: Lucía Iglesias
Tradução: Luciana Gaffrée