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Sob uma nuvem de incertezas
En Montevideo,
Brasil
CONJUNTURA
Jair Krischke analisa a situação política e social no Brasil
Sob uma nuvem de incertezas
20150324-jair610
Foto: Gustavo Villarreal
Jair Krischke, presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos de Porto Alegre (MJDH), analisou, em entrevista para A Rel, a crise política e social que está polarizando o país, os antecedentes desta crise, arriscando fazer um prognóstico pouco alentador para este próximo período de governo.
“Existe uma grande insatisfação com este segundo mandato da presidenta Dilma Rousseff, com relação às políticas socioeconômicas, mas principalmente por causa dos grandes escândalos de corrupção, sendo o mais emblemático e recente o que envolve a petroleira estatal Petrobrás”, começou dizendo Krischke.

Para o presidente do MJDH, antes de começarmos a analisar o cenário atual de polarização, vivido pelo país, devemos retroceder até as grandes manifestações de 2013 em função da Copa do Mundo, que custou aos cofres públicos muitos bilhões de dólares na construção e/ou reforma dos estádios para se adaptarem aos padrões FIFA, algo que não tinha nenhum tipo de prioridade para o Brasil.

“As mobilizações foram muitas e grandes, e naquele momento os manifestantes também já protestavam contra a corrupção. Acredito que o acontecido foi que nem a Dilma nem os seus assessores souberam ler e interpretar a mensagem das ruas. E por não entenderem, responderam usando na época de uma dura repressão contra os manifestantes”.

Imediatamente depois, chegou o processo eleitoral, muito disputado e marcado pela aparição da Marina Silva como candidata à Presidência, depois da morte trágica de seu companheiro de chapa, o presidenciável Eduardo Campos.

“Este episódio deu um giro de 180 graus no panorama eleitoral”, levando o Partido Socialista Brasileiro (PSB), que apoiava a Marina, “do terceiro lugar nas pesquisas para o segundo lugar em poucas semanas, gerando por parte da campanha eleitoral da Dilma uma resposta de violência verbal nunca antes vista”.

Por fim, a Dilma foi para o segundo turno contra o Aécio Neves, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), vencendo-o por uma diferença mínima. “Porém, a campanha foi de uma enorme agressividade, o que terminou se traduzindo no mal estar generalizado que hoje se vive”, destaca Krischke.
A Petrobrás dói em mim
O escândalo de corrupção no centro da crise

Jair continua sua analise trazendo o “assalto descoberto na Petrobrás, um desfalque em cifras que dão medo”.

Acredito que não escutei antes na história desse país um caso de desvio que envolvesse tanto dinheiro”, aponta.

Por outro lado, a denominada operação Lava Jato*, levada a cabo pela polícia federal, revelou desvio de dinheiro para as campanhas eleitorais, o que aumentou ainda mais o clima de indignação generalizado”.

“A Petrobrás não é somente uma empresa estatal a mais, é a empresa estatal por excelência, é um símbolo nacional, o orgulho do povo. Então, quando se descobre que a petroleira foi roubada de forma escandalosa, é natural que nós brasileiros nos sintamos indignados”, clama Jair.

Quando eu era muito jovem – conta – saíamos para protestar nas ruas reivindicando a criação da Petrobrás, sob o lema “O petróleo é nosso”.

“Em uma dessas manifestações recebi uma paulada no pescoço que até hoje me dói quando o clima está úmido. Porém, também me dói cada vez que o roubo na Petrobrás é mencionado, porque fui parte daqueles que lutaram pela criação desta empresa”.
As viúvas da ditadura
Uma fração ridícula

Consultado sobre a sua opinião com relação a alguns cartazes presentes na manifestação reivindicando a volta dos militares, Jair afirmou que são obra de pequenos grupos.

É o caso das denominadas “viúvas da ditadura”, que levavam cartazes pedindo voltar aos tempos da ditadura, e que ficam estrategicamente em frente das câmeras de televisão para serem captadas.

“São alguns poucos idiotas que aparecem para reivindicar a ditadura e a volta dos militares, que nem sequer pensam na hipótese de um golpe, porque sabem que seria rejeitado e condenado pela comunidade internacional e pelas maiorias populares do país”.

Em Porto Alegre, a única pessoa que foi para a manifestação com um desses cartazes, uma senhora, foi retirada.

Por outro lado – indicou o ativista – há grupos que vão à manifestação pedindo a destituição da presidenta (o impeachment), algo completamente absurdo por ser inviável juridicamente, já que a Dilma não está sendo acusada diretamente de nada e não há comparação com o caso do Fernando Collor de Mello**.

O triste de tudo isto é que a Dilma – que eu conheço pessoalmente – se por um lado é uma mulher muito séria, carece de vocação política.

“Antes de ser presidenta, nunca foi vereadora, nem deputada, e não tem uma formação política vinculada ao Partido dos Trabalhadores. Pertencia ao PDT, de Leonel Brizola, mas sem as convicções nem o jogo de cintura do Brizola”, considerou Krischke.

Além disso, “ela é muito temperamental e está muito mal assessorada, não faz uma leitura correta da realidade que o país está vivendo”.

Para Jair, desde o primeiro mandato do Lula, que o PT não tem conseguido interpretar a luta de classes.

“Foi um governo conciliador. Por um lado foi amigo dos banqueiros, e por outro alavancou projetos sociais para as classes mais pobres, sem considerar a classe média, que foi completamente abandonada pelo PT”, assinalou.

“Esta é a classe que está insatisfeita com o governo, e é a que tem saído às ruas para se manifestar contra a corrupção e contra o abandono que sofreram. No meio disso, há um grupo nostálgico da ditadura e outro desinformado, pedindo o impeachment”.

Soma-se a isto a queda da atividade econômica, uma balança comercial deficitária e o aumento da taxa de desemprego, que se percebe mais intensamente nos setores do comércio e da construção civil.

“Em resumo, a situação é bastante complexa porque tudo isto acontece há apenas dois meses e meio da assunção do novo governo”, observa o ativista.

“As coisas estão saindo do controle: há ministros renunciando, históricos dirigentes da base do PT, como o senador Paulo Paim, que estão estudando sair do partido, a interna do PT parece estar enfrentando grandes dificuldades”.

“O panorama parece pouco alentador para Dilma”, concluiu Jair.
 
Rel-UITA
24 de marzo de 2015

* Lava Jato, nome dado à maior investigação sobre denúncias de corrupção realizada na história do Brasil. Iniciada em março de 2014, revelou um esquema que movia cerca de 4 bilhões de dólares em dez anos, onde aparece envolvida a Petrobrás.

** Collor de Mello foi presidente do Brasil entre 1990 e 1992. Realizou uma gestão fortemente neoliberal, e terminou sendo destituído pelo parlamente após um julgamento político (impeachment), ao descobrirem que estava no centro de um gigantesco esquema de tráfico de influências, subornos e contratos ilícitos. Esquema este montado pelo diretor da sua campanha, o PC Farias. A população exigiu o impeachment do Collor saindo às ruas, em enormes manifestações populares.

Tradução: Luciana Gaffrée

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