Ação é a primeira do tipo no Brasil e será replicada a outros setores
Doux Frangosul é condenada a ressarcir despesas acidentárias
Ação é a primeira do tipo no Brasil e será replicada a outros setores
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A Justiça Federal de Porto Alegre condenou, em primeira instância, a Doux Frangosul a arcar com custos do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) no pagamento de auxílios-doença acidentários concedidos a funcionários da empresa.
A ação coletiva é inédita no país e requer o reembolso dos benefícios concedidos desde setembro de 2007, obrigando a companhia ao ressarcimento futuro das parcelas, até que sejam cessadas.
Na sentença, proposta pelo INSS e assinada pelo juiz federal substituto Bruno Brum Ribas, são relatados 111 benefícios concedidos em decorrência de patologias inerentes às funções exercidas na empresa.
O valor a ser ressarcido ainda não foi calculado e só será definido quando a condenação for concretizada, mas já sinaliza para correção monetária dos valores pagos, que terá como base o INPC, acrescido de 1 por cento de juros moratórios, por mês.
Mesmo em primeira instância, a decisão já é considerada uma referência jurídica por responsabilizar coletivamente uma companhia que não atende aos requisitos legais de segurança do trabalho, ampliando, assim, a pena imputada.
O INSS justificou a negligência da Doux Frangosul apresentando relatórios de fiscalizações realizadas pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e que identificaram riscos ambientais no trabalho, como exposição ao frio, ruído, agentes biológicos, poeiras e condições ergonômicas, psicossociais e de organização do trabalho em desacordo com a legislação trabalhista.
A procuradora do Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul (MPT–RS) Enéria Thomazini revela que entre as condições degradantes de trabalho foram constatadas jornadas excessivas, chegando a 19 horas diárias em funções repetitivas, como o abate.
A empresa já havia sido alvo de ação civil pública do MPT-RS, que exigiu a adequação legal do ambiente de trabalho quanto às jornadas praticadas, ergonomia e assédio moral no cumprimento de metas.
Há menos de um ano, a JBS arrendou os ativos da Frangosul, sem assumir, no entanto, pendências, encargos e passivos da empresa. A reportagem do Jornal do Comércio tentou contato com o escritório da Frangosul, em Montenegro, que não respondeu. A empresa ainda pode recorrer da decisão.
Fiscalização busca melhores
condições de trabalho
Desde o início do ano, o MPT em parceria com o MTE tem realizado força-tarefa para fiscalizar as condições de trabalho nos frigoríficos avícolas no Estado.
O que define os ramos que serão alvos da atenção dos órgãos é a quantidade de acidentes e doenças ocupacionais relatados, explica a procuradora do Trabalho Enéria Thomazini. “Esse trabalho e a condenação têm efeitos pedagógicos para que as demais empresas se adéqüem”, comenta.
As duas primeiras empresas do segmento inspecionadas foram a Minuano, de Passo Fundo, e a JBS, que incorporou atividades da Doux Frangosul. Esta sofreu a primeira interdição ergonômica do país, que durou pouco.
“A empresa adotou algumas medidas e, através delas, foi possível reverter essa interdição para retomar as atividades. Dentre as medidas, foi proposta uma diminuição do ritmo de trabalho.
60 ações técnicas por minuto
Identificamos uma função de embalagem que requeria 60 ações técnicas por minuto e com a colocação de mais postos de trabalho, esse ritmo caiu para 40 ações técnicas”, comenta Enéria. “Foi a maior redução de ritmo já realizada no setor, no país.”
O órgão já sinalizou que as inspeções serão realizadas em outras atividades econômicas com grande incidência de acidentes de trabalho e que as ações coletivas de ressarcimento serão uma consequência, a exemplo da decisão contra a Doux Frangosul.
A condenação ao reembolso de benefícios pagos pelo INSS é um alerta para outras empresas, avalia a presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP).
“O resultado me parece muito mais pedagógico para que outras empresas cuidem do ambiente de trabalho”, diz, ressaltando que a decisão prevê retorno de recursos para a Previdência Social, mas que o objetivo central não é este.
“Existe a busca de retorno para o INSS, mas até que se prove em contrário, se a empresa efetivamente deveria ter cuidado melhor do ambiente de trabalho e não cuidou, a sociedade não pode pagar pela negligência dela”, pontua.